O Último Adeus a Rita Lee

O dia amanheceu mais cinza do que o comum na capital de São Paulo. A chuva que caiu no Parque do Ibirapuera deixou o local sem cor. O clima parecia ter sido cuidadosamente planejado para receber o velório de Rita Lee, que sempre deu muita atenção para o visual, como cenário e figurino, de suas apresentações. 

Ter o Ibirapuera como palco de sua última aparição neste plano é repleto de simbolismo. Ela conta em sua biografia como já adorava piqueniques no lugar quando ainda era a Floresta do Ibirapuera e que esteve presente na inauguração do parque, durante as comemorações de 400 anos da cidade. É difícil imaginar um lugar mais apropriado do que o cartão postal para alguém cuja ligação à cidade foi tão marcante e que – não à toa – a rendeu o apelido de Santa Rita de Sampa. 

O prédio escolhido para acomodar o caixão foi o Planetário, que tem sua arquitetura redonda e de longe lembra um disco voador. Mais uma ironia bem humorada condizente com a personalidade que tanto brincou ao longo da vida sobre nave mãe e extraterrestres. No teto redondo do prédio eram projetados pequenos pontinhos brancos que representavam a mesma localização das estrelas no dia 31 de dezembro de 1947, data em que Rita veio ao mundo. 

Quem foi ao velório viu fãs de todas as idades. Uns carregavam discos, outros livros. Teve gente levando cartaz e até quem carregasse violão. Não era raro ver gente aguardando na fila de entrada com olhar distante e aguardando na fila de saída com lágrimas escorrendo no rosto. Dentro do prédio, um caixão marrom fechado com flores em cima. Abaixo, flores, uma bandeira do Corinthians (seu clube do coração), cartazes e outros presentes de despedida que foram sendo colocados pelos fãs.

Disputando espaço com os numerosos repórteres da imprensa que cobriam o evento, estavam também numerosas coroas de flores. Teve coroa de celebridades, de artistas – como a de Jorge Ben, seu amigo de longa data-, de fã clubes e outras anônimas. Uma delas, por exemplo, dizia “um obrigado de uma das tantas pessoas que você fez feliz”. 

Foi assim o último encontro de Rita Lee com os fãs. Uma quarta-feira cinzenta e chuvosa. Diferente do que aconteceu ao longo de toda sua carreira, desta vez quem se destacou foi o silêncio. Essa ausência de som, no entanto, é passageira. Seu corpo pode estar indo embora, mas sua voz já é um patrimônio imaterial da música brasileira e continuará ecoando por gerações.

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