Nostalgia e Afeto: Lucas Gonçalves Abre sua História em Disco Solo

foto por carime elmor

(Este texto foi feito com base em uma primeira versão do disco. Antes de seu lançamento, o artista modificou o repertório e, com isso, o artigo ganha uma atualização ao final)

Os trabalhos feitos em banda, no geral, trazem uma identidade coletiva. Cada músico ali coloca um tanto de si no que ouvimos, cada música é, por si só, um soma. Nos trabalhos que chamamos de “solo”, por mais que muitos colaboradores façam parte dos bastidores, as faixas são partes de um mosaico que revela o artista que assina a obra.

À frente de Vitreaux e do lado de dentro da banda Maglore, Lucas Gonçalves aproveitou a oportunidade de trabalhar em um primeiro disco só seu para falar de si de uma maneira que não seria possível dentro do coletivo. De situações vividas no passado distante a emoções que o acompanham hoje, Se Chover é o tipo de obra em que, ao final da audição, o ouvinte percebe que conhece melhor o músico por trás das composições e arranjos.

“Pensei em contar mais a minha história”, disse ele ao Música Pavê, “passeei pela minha infância, no interior de Minas, e deixei transparecer na poesia alguns bordões que ouvi muito por lá. Toquei violão no disco como toco quando estou em casa, compondo. Sem nenhuma técnica rebuscada ou arranjo mais desenvolto. As baterias rolam soltas também, como que improvisando. Quis que soasse bem orgânico, como uma gravação analógica. Tem aí algumas canções que ficaram guardadas por muito tempo, esperando o endereço do disco certo”.

Com lançamento marcado para 07 de outubro, Se Chover foi produzido por Lucas ao lado de Luciano Tucunduva. Iniciado pelo single que nomeia a obra, lançado ainda em 2019, o disco passeia por uma musicalidade familiar para quem conhece Vitreaux, mas ainda mais enraizada na nostalgia.

Tem a ver com a investigação do imaginário pessoal e o mergulho no passado que ele comentou. O tom orgânico que permeia as canções – tanto na timbragem, quanto no grau de sensibilidade que elas trazem – se liga também à capa, feita em bordado pela artista Tainá Denardi baseada em uma ilustração de Carol Reis. Tudo é artesanal, afetuoso, com cara de “família”.

Ao longo da audição, a faixa Vira Lata salta aos ouvidos como a mais diferente do repertório. Ironicamente, seu processo de criação parece ser o que melhor exemplifica a qualidade orgânica com que o álbum foi feito. “Usei uma guitarra semiacústica e gravei a voz nesse mesmo take“, conta Lucas, “adicionamos alguns overdubs de violão, percussão, bateria e baixo elétrico”. O vocal que ouvimos na música pronta é aquele da gravação da guitarra.

Muitos dos arranjos no disco se concretizaram na hora da gravação, ao contrário do que ele faz com Vitreaux (“a gente fecha os arranjos já nos ensaios, bem antes da etapa de gravação”, em suas palavras). “Chamei Pedro Lacerda (bateria), Diogo Valentino (baixo elétrico) e Mali Sampaio (baixo acústico) para ensaios um pouco antes das gravações começarem pra valer”, conta Lucas, “testamos alguns caminhos e gravamos uma pré antes de entrar em estúdio, mas muitos arranjos foram criados depois”.

O resultado disso tudo é, como dito antes, um retrato muito sensível de quem é Lucas Gonçalves não só como artista, mas como pessoa. Não é um álbum que aproveita artificialidades para disfarçar alguma coisa, mas, ao contrário, coloca sua humanidade em primeiro plano. Como o próprio artista comenta, Se Chover se assemelha aos “discos gravados ao vivo, quando erros viram acertos”.

Se Chover

01. Se Chover
02. Na Bagagem
03. Precisa Algo Acontecer
04. Sol e Chuva
05. Basta
06. Temos Nós
07. Vira-Lata*
08. Prece
09. Baixa a Poeira
10. Se Chover II
11. O Sol Vai Nascer outra Vez

*Atualização em 25 de setembro

A duas semanas de seu lançamento, Lucas Gonçalves optou por retirar Vira-Lata do repertório de Se Chover. Ao ser indagado sobre a decisão pelo Música Pavê, ele esclarece que foi uma “decisão de última hora que eu vinha trabalhando meio que no inconsciente. Ouvindo o disco na íntegra, percebi que essa música desviava a atenção de todo o enredo. Senti que ela estava fora de lugar. É uma música que gosto muito e pretendo lançá-la em breve como single. Acho que ela ganhará mais força fora do Se Chover e acredito que o álbum vai bem sem ela”.

De fato, como o artigo original apontava, era uma faixa que destoava das demais. Por melhor que ela seja (e é mesmo uma bela música), sua exclusão não compromete negativamente a experiência de Faz Chover, só a torna ainda mais coesa.

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