O quarteto de fortaleza Selvagens à Procura de Lei segue com sua turnê Praieiro, referente ao último álbum de mesmo nome. Agora em dezembro, a banda levou o groove de sua última obra a novos ares, Buenos Aires. Selvagens segue assim divulgando a mistura e combinação de sons que seus três álbuns nos proporciona a quatro ventos. Entre premiações, como de melhor música do ano pela revista Rolling Stone com seu single Tarde Livre em 2016, mostra que sabe tanto abraçar o underground quanto o mercado. Nas rádios, o que mais se ouvia de rock era seu single premiado e também sua Despedida.
O que mais nos chama atenção é a força de se reinventar que a banda tem em cada álbum. Se você ouvir o primeiro, Aprendendo a Mentir, o segundo, Selvagens à Procura de Lei, e o terceiro, Praieiro, não vai encontrar relação de um para o outro. O disco que abre sua discografia é mais indie rock, com aquela influência de The Strokes e Arctic Monkeys, um som com energia de sobra. Já o segundo, que leva o nome da banda, é seu “álbum branco”, mais introspectivo, nos remete a uma beatlemania, como em Sr. Coronel, que abre com um baixo e um piano e traz camadas profundas e uma crítica ao conservadorismo, além de canções enérgicas, como Massarrara, e da balada já citada Despedida, com seu bonito desfecho. Carrossel em Câmera Lenta é uma outra que indicaria pra quem não conhece a obra. Letras sensacionais, críticas e poesia. Já o terceiro álbum faz jus ao nome, Praiero. Você sente seu groove, a vontade de dançar, ao lado de uma outra face da banda, o reggae evidente em Guetos Urbanos (outra faixa de conteúdo crítico) e em Felina.
Para entendermos mais do seu som e do momento atual do grupo, Gabriel Aragão (vocalista, compositor, guitarrista e pianista da banda) falou ao Música Pavê por email.
Música Pavê: Muitas de suas músicas contém criticas muito bem trabalhadas, que quem não parar e prestar atenção pode não perceber. Vejo uma influência de Legião Urbana, e tive certeza dessa visão com o ótimo cover que vocês fizeram de Geração Coca Cola. Enquanto dizem que não dá pra fazer critica e ainda aparecer nas rádios, vocês conseguem contradizer esse pessoal e fazer isso muito bem. E vocês, como vêem a essência da banda? Quem é Selvagens à Procura de Lei hoje?
Gabriel Aragão, Selvagens à Procura de Lei: Realmente, quando a gente começou em 2009, já fazia um tempo que banda brasileira não tocava em temas um pouco mais políticos ou sociais, especialmente depois da influência deixada por Los Hermanos. Parece que todo mundo quis entrar na mesma onda dos caras. Eu também era fã de LH, mas decidi me distanciar como uma tentativa de não querer soar como eles. Selvagens à Procura de Lei, nas primeiras gravações, já cantava sobre o que significava ser jovem e morar em Fortaleza (Sobre Meninos Elétricos, Amigos Libertinos), ou descrevia personagens marginalizados (Mucambo Cafundó, Patrícia Narcisista). Enfim, acho que foi a forma que a gente encontrou de ser nós mesmos nas letras e de dar vazão à nossa personalidade na composição. Acho que essa essência continua na gente, mas, como não gostamos de nos repetir, ela vem sob pontos de vista diferentes… Seja com raiva (Brasileiro), com ironia (Sangue Bom) ou com outros personagens (Sr. Coronel). Tenho certeza que esse lado sempre vai estar em nós, mas eu não vejo Selvagens como uma banda que só tem o discurso político. Somos muito mais do que isso. Miramos no futuro. Nossa essência é mutante. Pra mim, Selvagens hoje, assim como ontem, é algo que busca o novo, que olha pra frente e que não tem medo de mudar.
MP: Vi uma entrevista em que vocês falavam como o que vocês estão escutando influencia o som de vocês – como no último disco, em que vocês estavam ouvindo uns grooves, e no penúltimo era algo mais introspectivo, e tinha até uma certa psicodelia, como Enquanto Eu Passar Na Sua Rua. O que vocês andam ouvindo ultimamente? Isso dá pistas dos próximos lançamentos?
Gabriel: Eu particularmente tenho escutado os últimos do Arcade Fire, Gorillaz, Noel Gallagher e U2, o disco novo do Tim Bernardes, Twenty One Pilots, The War On Drugs… Tô muito interessado em teclado, piano… Cada vez mais fissurado em canto e viciado em letras e poesia à flor da pele.
MP: Dessa cena brasileira, o que vocês gostam de ouvir hoje em dia?
Gabriel: Eu ainda tô em choque dos últimos shows que vi de Dingo Bells e Ventre. Curti demais.
MP: Vocês mantém uma boa relação com bandas como Vivendo do Ócio. Vocês pensam em compor em parceria com outros músicos e gravar colaborações no futuro?
Gabriel: Seria muito massa. Até agora não aconteceu, mas acredito que vai rolar mais cedo ou mais tarde. Recentemente, Supercombo lançou uma versão de Sol da Manhã com a participação de Selvagens à Procura de Lei. A gente adorou fazer parte desse projeto. Mas compor em parceria é algo mais profundo, tem que existir uma intimidade ou dar o primeiro passo pra criar essa energia. Sinto que a nossa geração se conheceu pra valer esse ano. Quem sabe o que 2018 vai trazer?
MP: Em Praieiro, podemos ver que a mudança pra São Paulo influenciou a banda, e sua vida mais corrida. Passado esse tempo, o que a cidade tem proporcionado a vocês hoje?
Gabriel: São Paulo, e eu não digo isso apenas por mim, mas por todas as bandas, tem aproximado toda a geração atual do rock no Brasil. Mesmo quem não mora aqui dá um jeito de estar presente na cidade. Dingo Bells, Maglore, Vivendo do Ócio, Scalene, Plutão Já Foi Planeta, Far From Alaska, Ego Kill Talent, Supercombo, Medulla, Projeto Rivera, O Terno, The Baggios, Zimbra, Boogarins, Dona Cislene, Oto Gris, O Ventre, Circo de Marvin, Vespas Mandarinas… É um momento único para ser músico e viver em SP. Para Selvagens, São Paulo abriu portas e horizontes.
MP: Como foi se apresentar na Argentina? Vocês pensam que uma viagem dessas pode influenciar o som de vocês de alguma forma?
Gabriel: A Argentina é um país de pessoas incríveis e de uma cultura fortíssima. Adoro o jeito como eles tratam a música autoral e as bandas de lá, novas ou mais velhas. Nossa passagem foi muito gratificante porque pudemos nos apresentar ao vivo, conhecer músicos, produtores, ir para rádio, além de gravar um clipe bonitão em Buenos Aires com o nosso parceiro Rafael Carvalho, comer muitas papas fritas, alfajor e assistir ao jogo do Flamengo vs Independiente.
MP: No ano que vem, vocês tem mais um Lollapalooza Brasil para se apresentar. Tem algum outro festival ao redor do mundo que sonham em tocar?
Gabriel: Todos! Mas, sendo mais específico, aqui no Brasil a gente quer muito tocar no Planeta Atlântida, Coquetel Molotov, Abril Pro Rock, Festival de Verão de Salvador e tantos outros, em especial festivais na região Norte e Centro-Oeste do país.
MP: Depois de um descanso merecido pós-turnê, o quê a banda pensa em realizar em 2018?
Gabriel: 2018 vai ser lindo. Começa com o show do réveillon de Fortaleza e logo depois tem lançamento de single inédito. Ficamos nessa nova turnê até o Lollapalooza. Em seguida, espero produzir o material novo. Também vamos fazer o primeiro registro ao vivo da banda.