Música Para Envelhecer… E Morrer
Quando eu era garoto, e lá se vão uns vinte anos, as pessoas diziam que “música não tem idade”.
Isso porque as rádios e as novelas estavam sempre a revelar sucessos de Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Lulu Santos, Legião Urbana, Paralamas… ou mesmo de “novos” compositores nas vozes de nossas grandes intérpretes mulheres. Músicas que eram e são sempre lembradas facilmente. Com letras, harmonias e melodias construídas com o mínimo de cuidado.
Não vamos entrar no mérito de que as gravadoras interferiam no que iria ser lançado e hoje o público pode eleger o próximo sucesso pela Internet e também não se pode negar que havia “música ruim” também. Mas isso é papo para outra história. Fato é que os hits eram, por exemplo, Toda Forma de Amor (Lulu Santos), Lourinha Bombril (Paralamas), Paratodos (Chico Buarque), Garota Nacional (Skank), Por Enquanto (Cássia Eller), Garotos II (Leoni), Fica Comigo (Placa Luminosa), Beija Eu (Marisa Monte)…
O mundo passa por suas revoluções. Ditaduras cinquentenárias têm seu fim, o Brasil é o sexto na economia… e a música tem idade. E morre ainda criança. Uma pena, penso.
Agora, o importante é fazer uma canção que seja fácil de cantar, com versos nada difíceis, que não façam o ouvinte parar para pensar o que eles querem dizer e, assim, imaginar toda a cena, fazendo da música um filme pessoal e íntimo, que vez em quando entra em exibição na cabeça, estimulado por alguém ou algo. Agora o importante é cantar o fácil. Como, ainda em 1998, dizia a turma do Jota Quest: “Fácil pra eu e todo mundo cantar junto”.
Inevitável, nesses tempos, não citar o estrondoso sucesso de Ai, Se Eu Te Pego.
Seguem seus versos: “Sábado na balada / A galera começou a dançar / E passou a menina mais linda / Tomei coragem e comecei a falar / Nossa, nossa / Delícia, Delícia / Assim você me mata / Ai, se eu te pego”.
A composição é de uma cantora chamada Sharon Acioly e a fama é de Michel Teló. Anote a dica dela: na hora do “delícia” você deve passar a mão na delícia mais próxima.
Uma música para curtir na noite/balada, com os amigos, no churrasco, na praia… e esquecer antes de chegar em casa, se os programas de tv, de rádio, os jornais, as revistas, os sites, o porteiro e o vizinho permitirem.
Mas, caso contrário, não se preocupe. Em breve vai surgir algum outro, tão “igual” quanto, para assumir o topo das paradas e, provavelmente, da sua mente. Daqui a alguns meses na tv, nas rádios, nos jornais, nas revistas, nos sites, seu porteiro e seu vizinho vão dizer que essa música é muito velha. E se alguém no metrô cantarolar um pedaço vai ouvir aquelas frases: “Essa é do fundo do baú! Nem me lembrava!”.
Assim como aconteceu com Meteoro (Luan Santana), Fugidinha (Michel Teló), Tô Nem Aí (Luka) e muitas outras, Ai, Se Eu Te Pego vai envelhecer… e morrer.
O próximo, por favor.
Boa reflexão, Paulinho. Sou um desses defensores da ideia de música ser eterna, mas o mercado que se criou em volta disso impõe um prazo de validade muito bem definido pra produção cultural hoje. Existe aí também uma diferença na postura do ouvinte, que deixa de “escutar” música para “consumir” música. Uma das consequências é justamente o desgaste do termo “popular” nessa arte, que deixou de significar “não-erudito” para hoje ser sinônimo de qualquer produto de baixa qualidade. Vamos ver quais serão os próximos passos do mercado, eu permaneço um pouco otimista na esperança de que as pessoas vão aprender cada vez mais ou a ouvir música de fato, ou a saber diferenciar o que é para um consumo numa situação específica e o que merece ser ouvido à exaustão.
Tomara, André. Acho que estamos numa fase de mudanças. Espero que o mercado saia fortalecido, assim como a boa música também.
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