Música em Recortes e Retratos
O ano é 2011, uma época em que as teorias de Arte já possuem repertório vasto para se pensar sob diversos pontos de vista a produção cultural ao mesmo tempo em que ela é feita, ainda que haja muito espaço para novas ideias.
Não importa o seu nível de conhecimento dessas filosofias, você pode recortar e colar os pensamentos – desde os que já viraram senso comum até os mais refinados – de maneira que você aprecie cada vez mais as expressões artísticas (e os mais atentos sabem que esse é um dos propósitos do Música Pavê).
E se seus olhos e mente se mantem abertos, você tem reparado a fase de recortes que estamos vivendo não só mentalmente, mas também na produção cultural. Talvez pelo raciocínio que a informática nos deu (o control C/control X e control V), a fragmentação e reorganização faz parte do nosso cotidiano hoje mais do que nunca, o que é essencial para o audiovisual (idéia recorrente no blog amigo nosso Corta e Cola), mas presente nas mais diversas áreas.
Artistas tem se aproveitado dessas ideias desde o Dadaísmo, com seus poemas e criações visuais feitos até mesmo com recortes aleatórios. A Pop Art (com o ready made) e a maturidade da Indústria Cultural ao longo do século passado nos trouxe a um ponto que, combinado com os ideais de reaproveitamento (vindo das ciências ambientais) e a facilidade ao acesso e produção, a criação – seja ela profissional ou amadora – sabe criar produtos híbridos dos mais diversos a partir de obras já existentes, por exemplo a obra de Vik Muniz.
A americana Sandhi Schimmel é uma das artistas que tem se destacado com isso. Ela cria retratos a partir de colagens em mosaicos de revistas, calendários, cartões postais e até mesmo emails de spam que ela imprime. A artista realiza tanto trabalhos por encomenda, quanto recria figuras recorrentes da cultura pop, incluindo da indústria fonográfica. Olha só:
Já o artista que atende pelo nome de Mr.Brainwash faz retratos de músicos a partir de vinis quebrados. É sua maneira de não só reaproveitar os materiais, mas de manter a arte feita para a música dentro de seu universo, adquirindo uma nova beleza a partir do próprio disco. Veja:
Mas não são apenas os materiais físicos que podem ser recortados e reorganizados. Letras de música constantemente viram obras de arte de apreciadores ou profissionais do design. É uma apropriação muitas vezes em nível emocional, a partir não apenas de admiração pela canção, mas identificação com o que ela diz. Daí, uma vez retirado de seu todo, o verso ganha tratamento estético visual, adquirindo sentido fora de seu contexto e encerrando seu significado em si mesmo, como nestes exemplos:
(verso tirado de You Are a Tourist, do Death Cab for Cutie)
(verso tirado de Hello, Goodbye, dos Beatles)
Muitos entendem a música como um recorte de tempo organizado ritmicamente e melodicamente. O próprio tempo pode ser reconhecido através de cortes que fazemos nele. Daí a naturalidade de recortar-se a música para criar novas obras artísticas.
Para acompanharmos a produção e a disseminação dessas colagens pela Web, criamos um Tumblr onde publicaremos imagens que carregam esses princípios em si mesmo, utilizando recortes a partir de materiais físicos (como os mosaicos), de letras de música ou mesmo de ideias do repertório popular, como as imagens dos músicos acima que nem precisam de legenda para serem identificados, pois já estão colados em nossa mente.
Conheça o Tumblr do Música Pavê através deste link e veja mais posts sobre música e artes visuais por aqui.
Oi, André! Adorei a introdução desse post, a parte inicial sobre a cultura das colagens… faz realmente muito sentido, é exatamente esse o espírito do cenário cultural contemporâneo, acho que tanto pela apropriação do “crtl+c crtl+v” na vida real quanto pela sensação recorrente de “não há mais nada que criar, só podemos reinventar”.
Nesse sentido, achei sensacional o trabalho de Sandhi Schimmel – leva até a uma reflexão sobre a qualidade de “ídolo” na nossa sociedade, afinal, o que são ídolos além de notícias e divulgação bem feita, além de papel e papel?
Achei o trabalho do Mr. Brainwash de uma qualidade inferior – talvez pelo fato dele trabalhar com uma ideia lugar comum, de construir ídolos da música a partir de discos, e principalmente pelas figuras serem em alto-contraste – mas isso é evidente pela própria lógica por trás do Mr. Brainwash. Ele na verdade não é bem um artista, mas um personagem criado pelo controverso Bansky para satirizar o mercado de arte… por isso, geralmente, as obras do Mr. Brainwash representam padrões clichês de arte. O Mr. Brainwash surgiu pela primeira vez no semi-quase-mas-não-exatamente-documentário “Exit Through the Gift Shop”, dirigido pelo Bansky/Mr. Brainwash. (Pra quem tiver interesse em saber mais sobre o filme, há um tempo escrevi no FC um post sobre ele: http://bit.ly/k4qeAQ )
Última coisa (prometoooo, sei que falei demais!): uma pequena observação, o “ready made” não é parte da Pop Art, como fica meio que implícito no texto! Só dando uma pincelada rápida, o “ready made” na verdade é mais coisa do Duchamp, que não é bem um artista da Pop Art. 😛
Mas, em resumo: ADOREI O POST! \o/
Totalmente certa, Ju! O ready made foi exaustado pela Pop Art, mas Duchamp já usava o conceito décadas antes. E eu preferi me referir ao Mr. Brainwash como artista, e não como personagem, justamente porque Banksy também é um personagem criado por alguém que a gente não sabe quem é hehe Daí, personagem por personagem, preferi me referir a ele como “artista” mesmo. Obrigado pelos comentários de sempre!