Vítor Guima: Sobre o Não-Pertencimento
O Estrangeiro, uma das obras mais conhecidas de Albert Camus, foi de tamanha inspiração para o paulista Vítor Guima a ponto dele batizar assim seu primeiro álbum. Conceitual, o disco traz uma narrativa que coloca o eu-lírico em um contexto onde se sente alheio à sua natureza, uma sensação comum ao indivíduo que chega em outro país.
Falando ao Música Pavê por telefone, o cantor e compositor comentou que seu O Estrangeiro “tem um diálogo massa com o que a gente passa no mundo contemporâneo, na era dos likes, que é esse sentimento de não-pertencimento”. Ele mesmo comenta que, enquanto muitos músicos optam por lançar um disco de estreia com uma coleção aleatória de suas melhores composições, seu primeiro álbum vem conceitual, “que vem de uma filosofia existencialista e fala de um não-lugar”.
A própria ordem das músicas traz consigo um senso narrativo que revela mais sobre a obra e sobre o personagem central. Como Guima explica, “nas duas primeiras faixas, ele está desolado, perdido. Da terceira à quinta, ele passa por uma tentativa de movimento e, da sexta em diante, ele parece ter entendido essa busca em que ele está inserido. Tenho para mim que essa busca faz parte da nossa existência, e esse é o conceito do disco”.
Não é de se espantar que Vítor Guima cite Camus, Fernando Pessoa (com uma Balada para Álvaro de Campos no disco) e Baudelaire entre as influências para a obra. Atuando também no jornalismo cultural e no cinema, o artista é desses cuja criatividade interliga o repertório adquirido nas diferentes linguagens. Seu processo, contudo, costuma ser bastante específico.
“Sinto que tenho as fases em que é fácil pensar tudo como roteiro, as em que tudo fica mais musical e também as fases em que tudo fica melhor escrito. Não acho que eu sou um desses caras pura inspiração. Gosto daquela fala do Picasso em que ele diz que inspiração existe sim, mas ela tem que te pegar trabalhando. Existe para mim, no processo de fazer um disco, o trabalho de sentar toda noite e cantar, escrever, jogar coisa fora, reescrever etc., como em um roteiro”.
Em 18 de agosto, Vítor Guima fará show de lançamento de O Estrangeiro em Araras (SP), no Teatro Estadual ao lado do músico Jacintho. Sobre esse encontro, ele comenta que ambos compartilham “uma grande paixão pela música”: “Quando ouço Tropical Desespero, vejo que ele é um cara que está esteticamente abordando a nossa época, tentando repensar o que é ser um latino-americano no século 21. De maneiras diferentes, nós dois estamos tentando entender o tempo que estamos passando”.
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