Entrevista: Scalene

Quatro anos separam a primeira entrevista que Scalene deu ao Música Pavê deste novo papo com o baixista Lucas Furtado. Com tantos acontecimentos nesse meio tempo, ambas as ocasiões têm algo em comum: Aconteceram logo antes da banda tocar no Lollapalooza Brasil – seu show será na sexta, 05 de abril.

O período viu o quarteto de Brasília crescer e se tornar um dos nomes mais relevantes desta geração, estando sempre ligado a outros grupos, investindo no som que quer fazer e sendo consciente do universo que está inserido. Foi sobre tudo isso que conversamos por telefone, além de seu trabalho como produtor de vídeos para outras bandas (afinal, Música Pavê, né?).

Música Pavê: Há quatro anos, Scalene tocava pela primeira vez no Lollapalooza Brasil. Analisando hoje, como esse episódio ficou marcado na sua memória?

Lucas Furtado, Scalene: Foi tudo muito surreal, era um momento muito diferente para a banda. Essa pergunta engloba muito sentimento (risos). Todo o processo do Lollapalooza foi o estopim, vivíamos a calma antes da tempestade. A gente estava voltando do SXSW (EUA), chegou em um fim de semana e tocou já no outro. Estava na pilha pela oportunidade, Scalene estava começando a colocar a cabecinha pra fora. Logo depois do lolla, foi aí que a gente conseguiu projeção nacional. Foi a primeira grande coisa daquele período, a gente ficou felizão. Era uma meta traçada um ano antes, quando a gente foi ao festival como público e falou: “Queria tocar aqui no ano que vem”.

MP: Você comentou da projeção nacional que a banda teve. Sobre o alcance de vocês, eu sempre tenho a impressão que Scalene tem uma noção muito realista do tamanho que possui, tem os pés no chão em relação ao território que ocupa, mesmo em um cenário quando as pessoas costumam ter expectativas irreais. Como você enxerga isso?

Lucas: Concordo contigo em dois aspectos. A gente tem a noção do tamanho que tem e aonde quer chegar, mesmo sem nunca ter nada garantido. Não é porque Scalene tocou no Rock in Rio que é uma das maiores bandas do país, a gente sabe que não é assim que acontece. A gestão da nossa carreira é feita por nós mesmos, e isso continua sendo muito importante. A gente traça os objetivos, vai atrás do que quer, quebra a cabeça para chegar nos lugares. Essa expectativa é muito louca, porque o público não costuma ter ideia do tamanho que as bandas têm, quem vê de fora não tem muita noção. Vendo a reação das pessoas na Internet, tem gente que acha que Scalene é a maior banda do país e tem quem ache que a gente tá escondido no underground. Nenhuma das duas está certa. É muito louco, é difícil mensurar essas coisas. Tem gente também que comenta que Scalene teria sido maior se tivesse surgido cinco anos antes, e talvez seja verdade, mas não tem como saber. Só que isso não nos incomoda, porque a gente sabe aonde quer chegar.

MP: E imagino que ter parcerias com tantas outras bandas só contribui ainda mais para você ter uma perspectiva mais clara dessa realidade.

Lucas: Claro, e até no convívio social, até na hora de tomar uma cerveja esse papo rola. É impossível sair com colega de banda e não trabalhar (risos). A gente tem muito amigo que não é do meio e você não consegue ter uma conversa sensata e realista sobre esses assuntos do seu cotidiano com quem não está vivendo no meio, porque é tudo muito mistificado, a galera não saca como é viver disso. Parece que ou é muito glamour, ou é muito fodido, e não é tão extremo assim.

MP: Meu palpite é que as pessoas possuem um imaginário de um rock que nem existe mais e inserem vocês nessa fantasia. O próprio termo “banda de rock” parece não ser muito preciso ao falar de Scalene, principalmente depois de +gnetite. É uma banda “de música”, que faz o som que quiser, não necessariamente aquele rock que os outros esperam.

Lucas: Ah, total. Esse é um assunto muito complicado que eu confesso não entender muito ainda, não sei como a cabeça da galera funciona. Você viaja pelo mundo e conhece gente de todo jeito, pode ser gente do meio da música ou não, e a única pessoa que se preocupa tanto com o gênero musical é o roqueiro. O cara fecha a cabeça pro que está sendo feito, só pode ouvir as músicas que estão aqueles pedais, aquelas afinações. Eu odeio repetir essa frase, mas o rock ficou careta, né? E era pra ser transgressor.

MP: E como você hoje entende o público que segue Scalene?

Lucas: A gente teve um contato muito louco com nosso público no ano passado, durante as eleições, de se ligar que muita gente liga mesmo para as letras, que leva as coisas para o lado mais pessoal. Isso ajudou que a gente entendesse mais o nosso público. É uma galera que tá ligada em coisas novas e que tem um anseio de ser tocada por uma mensagem. Acho que esse é um fator crucial para entender os fãs, saber que é uma galera que se identifica muito com as letras, que as pessoas pegam aquilo para elas. E rola uma fidelidade, a gente vê o cara defendendo as bandas nas redes sociais quando alguém fala que não gosta de Scalene.

MP: Nós aqui vimos isso acontecer quando soltamos a lista de oito melhores bandas desta geração. Chegaram até nós alguns debates nas redes, mas, no geral, era tudo muito respeitoso e muito consciente do universo que aquela lista representava.

Lucas: Acho que tem a ver com os integrantes dessas oito bandas levarem as coisas de uma maneira menos extrema. Não fiz nenhum estudo sobre isso, mas observo que fãs de Scalene são muito cabeça aberta nas discussões, o que tem muito a ver com a maneira que a gente mesmo lida com as coisas. A galera acha o máximo quando a gente celebra as bandas que a gente gosta, quando publica um parabéns a Boogarins, ou Carne Doce. A gente se preocupa em postar coisas de outras bandas também. Tem um termo que eu não gosto, o do influencer, mas, já que a gente pode influenciar, vamos usar isso para sair da bolha.

MP: Antes de terminar, conta um pouco sobre sua experiência nos bastidores dos vídeos. Eu desconfio sempre que, por você já ter vivido o outro lado, sabe melhor o que as outras bandas vão querer nos clipes, por exemplo.

Lucas: Eu não me vejo como um videomaker, mas como um entusiasta do vídeo. Estudo pra caralho para fazer um bom trabalho, gosto muito de poder produzir. Foi algo que surgiu muito sem querer com a banda Alarmes, e depois foi com amigos que eu vejo que posso ajudar, como francisco, el hombre, Alaska e Baleia – que é a banda brasileira que faz o som que eu mais gosto hoje. Costuma partir muito de mim do que eu acho que a banda deveria fazer. Escrevi quase todos os roteiros dos primeiros clipes da Scalene. Quando você faz isso, você sabe exatamente o que está na sua cabeça, e a comunicação entre banda e diretor nem sempre é tão clara. Vindo do background de banda, a minha cabeça tá mais perto da do cliente. Essa é a visão que eu tenho para oferecer.

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