Thalles Cabral: “A gente precisa aprender a dialogar”

De forma sensível e potente, o novo lançamento de Thalles Cabral evidencia uma das faces sombrias e doloridas do Brasil, a violência contra mulheres travestis, mulheres transexuais e homens trans. O clipe de Olívia é dirigido pelo próprio artista e protagonizado por Danna Lisboa (atriz, cantora, dançarina, compositora e mulher trans).

Para entendermos melhor a construção de Olívia, batemos um papo com Thalles e Danna, buscando pensar a importância de dar visibilidade a esse problema social – segundo a ONG Transgender Europe, o Brasil lidera o ranking mundial de assassinatos de pessoas trans.

“Em tempos de ódio e de tanta ignorância sendo reproduzida e compartilhada, sinto que é preciso se posicionar e lutar contra isso da maneira que pudermos – e com responsabilidade. Como artista, esse é o meu papel. Eu defendo e luto por uma sociedade mais justa e igualitária. A transfobia é uma realidade no país, com taxas altíssimas e assustadoras. E isso precisa mudar urgentemente. E para essa mudança começar a acontecer, precisamos falar cada vez mais sobre isso, reeducar a sociedade, trazer o assunto para debate. O meu álbum Utopia fala sobre isso; liberdade; sobre ser quem você é. E isso não deveria – e não pode – ser motivo para ninguém morrer”, declara Thalles.

Mesmo lidando com perseguições e agressões, a atriz (Danna) mostra uma Olivia capaz de enfrentar o mundo com dança, memória e verdade. Na última cena do clipe, há um momento catártico, onde as cores não são mais dor, mas esperança. A artista afirma que “Enquanto as pessoas não enxergam em nós a naturalidade, olhamos para nós tendo que buscar em nós esse lugar, de se olhar e se libertar em descoberta e resgate de valores próprios. Isso questiona o que é o valor que nos colocaram enquanto pessoas trans. Aí sim a possibilidade de naturalização começa a dar indícios no outro”.

Thalles acredita que o caminho para enfrentar tanta violência se dá pelo afeto. Ao trazer uma produção corajosa e forte, reforça essa crença e disposição: “O Brasil vai desaparecer com esse ódio todo. A gente precisa aprender a dialogar, com respeito e empatia – se colocar mais no lugar do outro. A gente nunca sabe a luta individual de cada pessoa. Esse é o único caminho para derrotar a ignorância e melhorar enquanto sociedade”.

A letra de “Olivia” foi composta em 2015, inspirada na peça teatral BR Trans, de Silvero Pereira, que traz fragmentos de histórias reais coletadas em conversas com travestis, transexuais e transformistas. Danna, parte fundamental em toda a elaboração e produção do clipe, relata que as imagens apresentadas são uma representação da vida real. Nas palavras da artista, sua trajetória “faz com que o clipe seja muito mais realidade do que ficção. Falar sobre isso é responsabilidade de todo mundo, é uma luta de todos nós. Amor e afeto ao próximo vão muito além de religião”.

Atualmente, o cantor está gravando seu papel como protagonista no filme brasileiro Ecos do Silêncio, produzido pela Asacine, que se passa em três países: Brasil, Argentina e Índia, com locações nas cidades de Brasília, Buenos Aires e Varanasi, perguntamos a ele se nesse tempo, das gravações, ele pode enxergar como as violências de gênero se dão, se de forma sutil ou nada velada. O ator declara que apesar do pouco tempo, pode perceber algumas questões.

“Fiquei relativamente pouco em cada um desses países, e a trabalho, uma jornada intensa de filmagens, portanto é difícil ter um retrato fiel sobre como cada lugar funciona. Mas nesse tanto que fiquei na Índia, a maneira como a mulher é tratada me deixou perturbado. O machismo está muito incrustado ainda e completamente descarado e naturalizado. Ouvimos algumas histórias de mulheres – da própria equipe local – de casos de violência doméstica, abusos, violência sexual. E são questões que, infelizmente, ainda acontecem muito no mundo todo”.

No próximo sábado (27) Thalles se apresenta no Z (Largo do Batata em São Paulo) ao lado de GeoAna Larousse, às 20 horas.

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