Protomartyr Traz o ‘Hoje’ Para o Centro da Discussão

foto por trevor naud

“Lançar um disco e dar entrevistas é sempre um processo estranho. Pelo menos, desta vez eu consigo fazer isso de casa”. Foram essas as primeiras palavras de Joe Casey ao Música Pavê ao comentar como tem sido, durante o período de isolamento físico, trabalhar para o lançamento do álbum Ultimate Success Today. Com a data de 29 de maio divulgada há várias semanas, o vocalista da banda norte-americana Protomartyr afirma que é incerto se o disco sairá mesmo nesse dia. Ironicamente, essa dúvida tem muito a ver com este que é o quinto disco do quarteto.

Em um primeiro momento, há uma relação estética e conceitual com o que Protomartyr vem trabalhando em seus doze anos de vida. É um som de muitas camadas, ora ruidoso, sempre com um certo grau de melancolia e tensão. Não é uma música sobre certezas, mas um trabalho cheio de sombras. Além disso, há o próprio conceito do álbum, sobre o drama de viver entre um passado difícil e um futuro desconhecido. Mas veremos o que ele tem para dizer sobre cada um desses temas, além da produção do clipe de Processed by the Boys, o primeiro (e, por enquanto, único) single do disco.

É interessante notar, seja nessa faixa ou na extensão da discografia que Protomartyr construiu, que suas músicas parecem ser tão meticulosamente trabalhadas quanto espontâneas, dicotomicamente. “Eu não sei como a música acaba ficando assim”, comenta Joe, “temos duas frentes trabalhando ao mesmo tempo. Tem a banda fazendo os arranjos, e eu nem estou mais por perto nessa etapa. Eles têm liberdade para fazer o que quiserem, sem ter que se preocupar com quando entra um refrão ou se precisa ter mais uma estrofe. A estrutura pode ser definida pela música. E eu entro depois, no desafio de escrever letras que façam sentido dentro disso. Mas também tenho a liberdade de escrever o que eu quiser. Sei que muitas outras bandas também trabalham assim, e é o que funciona para nós. Esse processo ajuda também a dar uma união grande para as faixas de um disco, mesmo que ele não seja necessariamente conceitual”.

Olhando para essa discografia, dá para notar como as músicas vão perdendo ao longo do tempo um certo aspecto de urgência. Ao ser questionado sobre isso, o vocalista diz também observar essa dinâmica. “Por um lado, estamos nos dando mais tempo para gravar”, conta ele, “o primeiro disco é mais rápido e urgente porque tivemos quatro horas para gravá-lo inteiro, enquanto para este novo, tivemos duas semanas. Outra resposta é que, quando começamos a trabalhar juntos, eu era um velho de 30 e poucos anos e eles eram jovens de 20 e poucos. Agora, eles têm a idade que eu tinha no início, então eles são os velhos e eu sou o cara velho mesmo (risos), estamos todos mais devagar”.

“Fomos uma banda de canções rápidas há um tempo, o que escondia nossa inabilidade de cantar ou escrever coisas interessantes. Você compensa isso com velocidade e barulho. E embora eu ainda goste dessas coisas, de fazer músicas barulhentas e feias, podemos agora tentar coisas diferentes. A banda está cada vez melhor com seus instrumentos e quer se repetir cada vez menos. Digo, às vezes você quer se repetir um pouquinho, porque sente que não deu seu melhor em algo que já fez. Mas é legal tentar algo inédito, e é essa a força que nos mantém indo em frente. Mesmo depois desse disco, sabemos que ainda tem muito o que podemos fazer. Queremos tentar todo tipo de músicas”.

No já mencionado vídeo de Processed by the Boys, os brasileiros encontram uma cena bastante familiar – um episódio televisivo que virou meme, para fora de nossas fronteiras. Sobre sua produção, Joe conta que a ideia veio quando “o selo pediu para diretores mandarem suas ideias, e, como costuma acontecer, eles ouvirem nosso som e virem que é algo obscuro e depressivo, então deram também sugestões obscuras e depressivas. E eu não gosto dessas coisas óbvias. Um dia, eu estava vendo um compilado de cenas engraçadas de TV e me deparei com esse vídeo. Completamente fora de contexto, sem saber que era um programa de TV brasileiro. E a imagem de um homem brigando com um fantoche é um tema universal (risos)”.

Esse grau de ironia é uma constante no que Protomartyr faz, presente até no título das músicas – o nome Ultimate Success Today é um exemplo -, e isso em uma época em que as mensagens costumam ser cada vez mais diretas, para um público que nem sempre se esforça em ler as entrelinhas. “Vejo uma grande vontade das pessoas entenderem as coisas, mas sinto que o grau de compreensão das pessoas ultimamente é bastante superficial”, comenta o vocalista, “eu mesmo já fiz isso, de dar uma olhada na Wikipédia, ou entender qual é o consenso sobre algo, ver o que a crítica disse… enfim, passamos a vista e já achamos que sabemos tudo. E sinto que todos podem se beneficiar de uma leitura mais aprofundada das coisas”.

E eis que o álbum chega em um período tão incerto para tudo e todos, uma época em que não sabemos o que pensar do amanhã – um tema que Joe concorda estar alinhado ao disco. “Esse álbum é sobre o fim das coisas, sobre a sensação de um término, quando você pensa no passado e ele te deprime, e olha para o futuro e ele é amedrontador e você percebe que não estará vivo para vê-lo. Então, tudo o que importa é o hoje”, explica ele, “eu queria trazer a urgência dos primeiros álbuns de alguma forma, mas sem nostalgia. É sobre aprender a lidar com o agora. É sobre várias outras coisas também, mas você terá que ler a Wikipédia para descobrir (risos)”.

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