Luiz Gabriel Lopes É “Devoto do Voz e Violão”

Luiz Gabriel Lopes estava mixando seu novo álbum e foi a Portugal fazer um show, quando veio a pandemia do Covid-19 e ele não só precisou ficar confinado lá no Velho Mundo como teve que repensar o que fazer dos planos com o disco. Seus processos mentais de como lidar com o imprevisto sem perder a esperança geraram Presente, um EP de quatro faixas gravado em voz e violão e de forma caseira, para trazer esses seus aprendizados.

Falando ao Música Pavê, ele conta que já faz um tempo que queria lançar um trabalho nesse formato. “Eu tenho uma espécie de obra paralela, que é meus vídeos no YouTube”, brinca ele, “muita gente me conheceu dali e tem até quem diga gostar mais das músicas no voz e violão do que nos discos”. A fome de se manter criativamente ativo durante o isolamento físico e a vontade de comer nesse formato resultaram na oportunidade certa de lançar o EP.

Presente começa com Minha Irmã, “que eu compus agora, na quarentena”, conta Luiz, “expressando meus sentimentos de saudades da minha irmã, mas é algo que serve para qualquer pessoa”. Em seguida, vem Recomeçaria”, gravada por Juliana Perdigão (com que ele trabalhou na banda Graveola). Ele descreve a música como “um pouco premonitória na necessidade da crença de que tudo sempre se transforma, de que a coisa sempre vai andar e a vida vai recomeçar”.

Lembrete, uma composição sua que gerou um dos melhores momentos que Graveola já gravou (em London Bridge, 2015), reaparece em Presente com o que ele chama de “uma recontextualização merecida”. Para fechar, vem Amigo, música composta por sua tia Socorro para seu pai. “É um repertório muito bonito que existe na minha família, canções de amizade feitas um para os outros que nunca foram lançadas”, conta o músico, “eu cresci ouvindo essa música achando que ela era famosa (risos). E ela é uma espécie de espelho da primeira faixa, mas de uma geração anterior”.

Quem dá play no EP, logo reconhece que ele está em uma ambientação bastante diferente da última vez que vimos Luiz – no último ano e pouco, ele co-fundou a banda pop e eletrônica Rosa Neon. “O trabalho com o grupo tem sido muito interessante porque é tudo muito fluido, as coisas vão caminhando sem que a gente planeje muito”, conta ele, “e o mais legal é poder mostrar essa minha metamorfose. Existe às vezes uma leitura um pouco superficializante do artista como alguém que deve fazer sempre a mesma coisa, quando é claro que a gente tem uma essência, uma maneira com que nosso sentimento se expressa mais naturalmente, mas a gente está sempre em movimento. O desafio e o risco são combustíveis importantes para a gente se manter interessado pela matéria criativa”.

Quem conhece sua trajetória não se surpreende com esse formato tão orgânico em um lançamento solo, em paralelo ao clima dançante da banda. “Minha relação como compositor nasceu do voz e violão, da sensação de preciosidade desse campo que me formou como artista. Meu primeiro disco solo, Passando Portas (2010), de uma produção bem rústica e mal acabada, tem esse clima de chegar no gesto mínimo e acreditar no poder que isso tem –  e eu tenho muito carinho por ele por isso”. “Eu sou devoto do voz e violão, essa coisa ancestral e futurista (risos)”, conta ele, “tem uma potência, uma magia dentro da coisa”.

“Acho que tem a ver com a consistência da expressão e do sentimento. Às vezes, quando a produção pesa muito, ela tem a capacidade de distanciar a música de si própria. Como produtor, tenho a tendência de pensar que o arranjo é aquilo que a gente coloca na música para não estragá-la (risos), é aquele ‘mínimo’ que a gente coloca. Entendo hoje que eu no formato voz e violão é uma das coisas mais potentes que eu tenho para oferecer. Esse é o meu maior aprendizado, e a alegria de perceber essa força também”.

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