Igor de Carvalho: “Falar de amor é resistência”
Cabeça Coração é o título que Igor de Carvalho deu ao seu segundo e recém-lançado álbum. Se alguns observariam uma ideia dicotômica no nome, com a razão e a emoção sendo opostos, uma audição mais atenta ao disco permite a interpretação de “união” entre lados diferentes, mais do que qualquer antagonismo entre as partes. Ao longo das onze faixas, o cantor e compositor pernambucano aparece ora doce, ora enérgico, às vezes com um volume sonoro grandioso, enquanto outras músicas soam sussurradas. Nessa multiplicidade, há cabeça e há coração por todos os lados, porque um só não sobrevive, mas também há tudo o que existe aí no meio.
“Adorei sua interpretação e super concordo”, disse ele ao Música Pavê por telefone, “seria limitante demais falar de duas vertentes só”. Neste, que é declaradamente um trabalho sobre amor, “tem um caralho de contextos”, como o músico afirma: “Não só falo de amor, mas de política, de espiritualidade, enfim. A gente tem, dentro de um caminho, bifurcações. Falar ‘não vou me acostumar com o que faz mal’ é falar de amor próprio, por exemplo. É uma forma de se chegar a uma conexão consigo mesmo e com Deus, que é o que eu acredito”.
Cinco anos separam Cabeça Coração de A TV, a Lâmpada e o Opaxorô (2014), período que foi “um desabrochar importantíssimo para mim”, em suas palavras. “O primeiro foi produzido de fora pra dentro, eu não tocava nem o violão. Nesses cinco anos de hiato de gravações, eu fui para o palco, o disco abriu muitas portas. Pude viajar bastante, com banda e sozinho, só voz e violão. O primeiro foi também muito mais uma compilação de músicas com compreensões completamente distintas da minha vida. Esse disco não, eu parei pra compor”.
“Não adianta falar de amor sozinho”, comenta Igor, “entendi que eu precisava colocar participações importantes de pessoas sérias que estejam dentro desse universo que eu tô querendo falar”. Foi assim que vieram Johnny Hooker (“meu conterrâneo, que entende o sotaque da vivência no Recife”), Zélia Duncan (“conhecia ela como tiete (risos), é muito louco, a gente acaba se relacionando e se envolvendo profissionalmente com nossos ídolos, é bonito pra caralho”) e o português Manel Cruz (“eu acompanho desde minha adolescência em suas bandas e no trabalho solo, eu gosto de tudo do cara, sou muito fã”). Essas escolhas, assim como as dos outros músicos que tocam no disco, vieram “da vontade de estar próximo dos amigos e das pessoas que eu admiro não só pela música, mas também pela coerência artística”, conta ele: “Hoje, o grande artista precisa dessa característica mais do que nunca, alinhar tanto discurso quanto comportamento. Acho que é o ponto primordial desse disco, a minha busca pela coerência”.
E Cabeça Coração é coeso do início ao fim, com suas pontas unidas pela voz de Igor de Carvalho e pelo conceito de fazer um disco sobre amor e suas diferentes perspectivas. “Acho que falar de amor é um ato político, é resistência”, explica ele, “em um momento tão desagregador, em que todos os discursos estão afastando as pessoas, é uma forma de manter acesa uma chama fundamental para o crescimento pessoal de cada um nesse contexto maluco. Eu não concordo com aquela ideia de que o artista faz música pra si, saca? Eu acho que o artista faz música pro mundo, pras pessoas ouvirem, pra dar nome às sensações, aos sentimentos. É tão importante a gente escrever pensando no próximo”.
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