Hamilton de Holanda: Choro e Jazz Sem Forçar a Fusão

Hamilton de Holanda está de volta e em grande estilo. No último show de uma turnê intensa pelos Estados Unidos, o consagrado músico fez o que sabe de melhor: Subiu ao palco com o bandolim nas mãos e impressionou a todos com seu chorinho. Foi no Dizzy’s Club, em Nova York — uma das casas mais importantes do jazz contemporâneo — que ele registrou o álbum Live in NYC, ao lado de Thiago “Big” Rabello (bateria), Salomão Soares (teclado/Moog) e a participação especial do saxofonista Chris Potter. O Música Pavê conversou com o músico para entender o que tem por trás de um disco que soa tão solto, tão afiado e acima de tudo: tão vivo.

O que o ouvinte escuta é o resultado de um mês inteiro de estrada, de hotel em hotel, casa alugada, lavanderia improvisada, dormindo tarde e acordando cedo, e dividindo todo. “Fomos azeitando a relação. Quando chegou no último dia, tocávamos praticamente sem olhar pro instrumento”, conta Hamilton, lembrando que o trio ouvia os próprios shows dentro do carro no dia seguinte, sempre analisando, ajustando, tirando o que não funcionava. É evidente que um artista consagrado não passa os mesmos perrengues na estrada comparado a quem está começando, mas pensar nessa maratona de 12 shows é fundamental para entender o que se ouve no resultado final.

E o palco não era qualquer um. Dizzy’s Club, parte do Jazz at Lincoln Center, é chamado de “House of Swing” por um motivo. O local já recebeu inúmeras lendas do jazz e, naquela noite, também recebeu Hamilton — que se emocionou ao ver sua foto no mural dos 20 anos da casa. “Foi como um gesto de gratidão deles com a minha música. E eu quis devolver esse carinho com um show impecável”, diz. É ali que o choro brasileiro encontra o jazz americano sem forçar a fusão. Os dois se reconhecem, se provocam, improvisam juntos. E quem ganha é o público, seja lá qual for o idioma.

Ainda que nunca tenha pedido o título, Hamilton sabe que é visto como uma espécie de embaixador da música brasileira. “Eu sempre fiz isso sem pensar. Mas já que me veem assim, vamos nessa”, brinca. Mais do que representar, ele parece carregar o desejo de fazer ponte entre países, gêneros, palcos e pessoas. Um caminho que ele reconhece como parte de uma tradição que vem de longe — Pixinguinha, Carmen Miranda, a turma da Bossa Nova. “Eles já pavimentaram a estrada. Eu tô no meu ritmo, mantendo a música brasileira bem relacionada com o mundo inteiro.”

Essa troca, aliás, é de mão dupla. Ao falar do que o Brasil ainda pode aprender com os “gringos”, Hamilton não pensa duas vezes: Estrutura, método e ensino. “Eles codificam o jazz pra ensinar. Nós ainda precisamos fazer isso com o samba, com o choro, com o baião. Já existem iniciativas, mas dá pra ir além”, afirma. Ao mesmo tempo, reconhece o que temos de único — e valioso. “O ritmo que temos aqui não existe em nenhum outro 

No fim das contas, Live in NYC é isso: uma celebração da convivência, da escuta, do improviso e da emoção que resiste mesmo quando tudo parece incerto. Ou como define o próprio Hamilton, num dos momentos mais tocantes da entrevista: “Pode estar difícil pra caramba, mas aí vem outro dia, o sol aparece, e a gente recomeça. Todo dia é um recomeço.”

Em tempos em que a polarização se torna regra e grandes nações erguem muros — simbólicos ou reais —, Hamilton de Holanda caminha na contramão. Ao misturar o choro com o jazz, ele não apenas é ovacionado no palco, mas carrega consigo toda uma cultura que nasceu do encontro, da escuta e da troca. Seu bandolim é ponte, não fronteira. E naquela noite, em Nova York, a música foi um instrumento de união. Que venham mais noites como essa.  

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