Gab Ferreira: “menos na primeira pessoa e mais uma fantasia”

foto por maria magalhães

Às vezes, a pressa de lançar um novo trabalho pode fazer com que um artista não reflita tanto sobre o seu próprio processo de fazer música. Gab Ferreira, no entanto, soube identificar exatamente qual era o momento de olhar para todos os lados possíveis antes de atravessar o caminho que a levaria à mixtape visions, lançada em abril. 

Da sua estreia com Lemon Squeeze (2018) ao momento atual, “passou um período longo de tempo, que foi muito importante para marinar e absorver tudo o que foi feito no primeiro álbum. Isso também me ajudou a ter uma visão clara do que eu gostaria de mudar, do que eu aprendi das primeiras coisas que fiz e de como eu queria traduzir uma nova ideia e uma nova visão do futuro nessa mixtape”, explica Gab Ferreira ao Música Pavê.

As novas perspectivas que permeiam visions serviram também como um desafio que Gab lançou a si mesma, a fim de entregar “algo que fosse mais maduro, um pouco mais complexo”, conta. “Em Lemon Squeeze, eu sinto que tentei fazer várias coisas que eu gostava de ouvir e juntar tudo isso. […] E agora, nesse disco, eu sinto que parei para pensar mais sobre o que é que eu tenho para entregar e o que eu sei fazer, para usar o meu potencial máximo”.

Com esse propósito, a catarinense tirou alguns planos do papel. Inspirada pela cantora britânica Imogen Heap, Gab quis brincar um pouco mais com a própria voz, fazendo com que os seus vocais soassem como um instrumento. O resultado funciona muito bem e combina com a sonoridade eletrônica de visions.

Ainda testando novas águas, Ferreira, até então acostumada a compor em inglês para que as emoções presentes nas letras fossem processadas com um certo distanciamento permitido pelo idioma, decidiu escrever sua primeira canção em português: a faixa me encontra lá 🙂. Karen Jonz – tetra-campeã mundial de skate vertical e também cantora – foi quem deu o empurrãozinho final para que Gab compusesse em português, língua que ela considera ter um impacto maior. Satisfeita com o resultado e também por apresentar uma nova maneira pela qual os fãs podem se conectar com a sua música, ela pretende continuar buscando sua voz no idioma materno.

Menos Wes Anderson e mais Crepúsculo

Sobre a sua nova estética, agora com menos cores, a artista revela: “Eu fiz todo o material visual de visions antes mesmo do álbum existir”. Durante a pandemia, Gab pintou seu cabelo de laranja, inspirada pelos animes que assistiu no período de isolamento, e isso se conectou ao seu processo criativo. 

“Eu estava com vontade de quase criar um personagem, meio que um alter ego”, com a intenção de que o projeto fosse “menos na primeira pessoa e mais uma fantasia”. Esses personagens aparecem nos clipes que já foram lançados até o momento, como nas produções de karma e também de faking it.

Além dos animes, a cantora também reviu muito o filme Crepúsculo na quarentena, o que acabou servindo de referência visual. “Lemon Squeeze foi muito solar, com mais cores primárias relacionadas à felicidade. Não consciente, mas uma onda Wes Anderson. Esse eu queria que fosse mais Crepúsculo”.

A volta dos shows

Nos últimos meses, a frequência dos shows e festivais tem aumentado e quase se igualado ao ritmo antes da pandemia de covid-19. Sobre esse retorno, Gab confessa que subestimou o impacto de se apresentar ao vivo, sobretudo porque no início da carreira, quando não morava em São Paulo, as suas músicas existiam apenas no mundo da internet e ela não fazia tantos shows.

Mas, quando de fato pisou nos palcos pela primeira vez desde março de 2020, ela notou que “foi uma sensação muito doida. Uma euforia de também estar com as coisas novas que eu fiz durante a pandemia, que foi um processo doloroso para todo mundo”. Nas nove faixas de visions, a artista enxerga a “possibilidade de mostrar o que restou de mim, após tudo que rolou”. 

Recentemente, a cantora se apresentou no Balaclava Fest com a banda Tuyo – que ela conheceu quando Lio e Lay Soares e a própria Gab participaram do programa The Voice. Além de experiências como essa, Gab também tem uma parceria marcante com a cantora YMA, com quem colaborou na faixa Summer Lover, de 2018. Desde então, as duas já apresentaram essa música ao vivo inúmeras vezes.

Ao refletir sobre esses momentos coletivos, Gab comenta: “Eu gosto muito quando existe essa possibilidade de fazer algo com outras pessoas, principalmente de trabalhar com outras mulheres, porque, querendo ou não, é uma indústria [a da música] muito dominada por homens, e eu sempre me interesso muito pela perspectiva feminina”.

Além de se conectar com outras pessoas quando está cantando, conseguir se conectar consigo mesma é algo valorizado por Gab Ferreira. “O que eu mais gosto do aspecto de fazer música é contar uma história, que eu vou poder coletar de novo daqui a 20, 30, 40 anos através de uma coisa que eu botei no mundo […]. Eu tô criando a trilha sonora dos meus anos, e eventualmente vai ser muito legal voltar e ouvir essas coisas, me conectar com essa pessoa que eu fui em cada momento”, arremata. 

Curta mais de Gab Ferreira e outras entrevistas exclusivas no Música Pavê

Compartilhe!

Shares

Shuffle

Curtiu? Comente!

Comments are closed.

Sobre o site

Feito para quem não se contenta apenas em ouvir a música, mas quer também vê-la, aqui você vai encontrar análises sem preconceitos e com olhar crítico sobre o relacionamento das artes visuais com o mercado fonográfico. Aprenda, informe-se e, principalmente, divirta-se – é pra isso que o Música Pavê existe.