Fresno Quer que Você Ouça um Álbum Inteiro

foto por camila cornelsen

“Nos tempos de hoje, o cara passa duas horas ouvindo um podcast, mas não ouve um álbum inteiro, né?”, comentou Thiago Guerra, baterista da banda Fresno, há cerca de duas semanas em uma entrevista ao Música Pavê para falar de Vou Ter que Me Virar . Lançado em 05 de outubro, o disco foi anunciado no lançamento da última faixa do projeto INVentário, uma mixtape apresentada aos poucos para “reaquecer os motores”, nas palavras de Guerra, para o álbum.

VTQMV sai pouco mais de dois anos após Sua Alegria Foi Cancelada (2019), um trabalho que teve sua divulgação interrompida pela pandemia do covid-19, que cancelou desde o show do trio no Lollapalooza de 2020 até todos os compromissos regulares da banda que garantiriam uma vida prolongada para o lançamento. “[Durante a pandemia,] a gente estava apto a fazer música pra caramba, produzindo de casa, mandando pra um e pra outro, mixar e pá”, conta Lucas Silveira, “a gente foi fazendo isso que estava ao nosso alcance para ir construindo esse buzz em torno da gente, pra quando a gente chegasse com o álbum, rolasse um ‘créu'”. Com o anúncio e posterior lançamento do disco, a própria INVentário pode agora ser vista com outros olhos pelos fãs, já que seu propósito ficou mais bem definido.

“A ideia foi trollar mesmo”, comenta o vocalista, “foi furar bolhas, foi tentar redescobrir como se fala sobre um álbum hoje. Todo dia sai um disco foda, que você tem que ouvir. Então… ah, é desesperador, vai? É desesperador você lançar um disco que as pessoas vão ouvir por três dias e falar “beleza, parabéns, mas quero ouvir as velhas” (risos). Você não consegue fixar aquele álbum na mente das pessoas, porque o que ajudava a fixar era toda a coisa offline – os shows, um clipe, sei lá”.

A audição de Vou Ter que Me Virar é marcada por uma característica compartilhada tanto com a mixtape que lhe precedeu, quanto com o próprio Sua Alegria…: Uma certa “elasticidade” sonora, a capacidade da banda se esticar a diversas direções dentro daquilo que constitui sua identidade. A faixa-título, que inaugura a obra, vem no clima “para dançar chorando”, seguida por FUDEU!!!, música tão cheia de energia punk quanto seu título, e o ouvinte repara logo na terceira faixa (Casa Assombrada) que o que vem pela frente é sempre a surpresa.

“Acho que o disco é até um pouco mais coeso do que foi INVentário, porque [a mixtape] não tinha a intenção de ser coesa, era só doideira, mas com certeza a impressão que a gente queria causar nas duas primeiras faixas, com sonzinho indie dançante com baixão e bateria,  depois uma faixa punk rock mais agressiva, era que o disco começasse de um jeito e [fosse construído] quase como um dj-set”. Vavo (Gustavo Mantovani) explica que “a ideia de emendar o fim de uma música no início da outra é a melhor coisa, porque se alguém quiser ouvir no aleatório, ferrou. Isso é importante até no INVentário, que ouvir fora de ordem é uma loucura”. Aos poucos, fica mais claro o quanto Fresno quer ver suas obras na contramão dos padrões de audição e produção dos dias de hoje, insistidos pelo mercado da tal “era do streaming”.

“A gente é uma banda que tem mais de 20 anos, e hoje os artistas podem até lidar de forma diferente com as suas carreiras, mas a gente organiza nossa vida por discos”, conta Vavo, “vem um álbum, tem uma turnê em torno dele. Eu não sei como um artista de hoje faz. Ele vai fazendo shows e acrescentando músicas? Não sei. A gente tem essa de organizar. Imagina a gente voltando agora sem um disco novo. Que que a gente ia fazer? Um show… Fresno, com algumas músicas aleatórias?”.

“Quando a gente entendeu a ordem do álbum, a gente já começou a trabalhar uma ‘tripa’ (todas as demos do disco enfileiradas em uma só linha do tempo), para estar sempre ouvindo o disco, entendendo a ordem e tal”, explica Lucas, “queria que ele fosse pop nem tanto na sonoridade, mas no sentido de ser direto, de dizer as coisas sem ficar enrolando, e depois o lado B ser mais introspectivo, com uma densidade que a gente já explorou bastante antes”.

Entre elogios a seu convidado em Já Faz Tanto Tempo – Lulu Santos, “o rei do pop!”, como Guerra comenta, ou, nas palavras de Lucas, “o quarto Fresno” – e empolgação para tocar no próximo Lollapalooza Brasil e estar de volta aos palcos, a banda se mostra, principalmente, otimista que os fãs vão comprar a ideia de ouvir Vou Ter que Me Virar como uma só obra e pede desculpas por ter “trollado” público e crítica, incluindo o Música Pavê, por omitir o álbum durante a divulgação de INVentário – “a gente saía das entrevistas e falava ‘caralho, que doideira’ (risos) porque queria comentar [sobre o álbum] e não podia”, conta Guerra, “mas não fazia sentido ainda. A gente queria furar as bolhas [com a mixtape], e a gente tá feliz, porque rolou”.

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