Entrevista: Mark Nevin (Fairground Attraction)

Perfect é uma dessas canções atemporais, que já nascia com cara de “clássica” em 1988, ano em que a banda Fairground Attraction gravou o disco First of a Million Kisses. Tanto a música quanto o álbum ganharam em suas respectivas categorias o cobiçado Brit Awards no ano seguinte. Seu compositor, Mark Nevin, começava ali uma nova fase, de mais respeito, em sua carreira.
Hoje, com sete discos autorais já lançados, o músico pode celebrar suas conquistas na música, seja no projeto solo ou com a banda. Inclusive, para comemorar os 35 anos da premiação que marcou suas carreiras, os membros se reuniram para o disco Beautiful Happening.
Logo após o lançamento e uma turnê, Nevin viajou ao Brasil, onde gravou videoclipe de seu single Shining on the Hill. A música entra para seu repertório de grandes composições, que já foram gravadas por nomes como David Bowie (!) e Ringo Starr (!!).
Falando ao Música Pavê, ele explicou a nova fase da carreira e a decisão de gravar o clipe no Rio de Janeiro.
Música Pavê: Como foi a escolha de gravar Shining on the Hill no Brasil?
Mark Nevin: No an passado, minha esposa teve um grande susto de saúde e, depois, decidi levá-la com nossos três filhos a uma viagem especial para celebrar sua recuperação. Sempre quisemos visitar o Brasil, então fomos, depois de passar por Buenos Aires, a Foz do Iguaçu, Pantanal, Paraty e Rio, na Páscoa. Nosso filho do meio, Stanley, é um videomaker e trouxe sua câmera, então visitamos lugares icônicos do Rio e gravamos o que vimos. É o local perfeito para Shining on the Hill, porque tem muitos morros (“hills”) e o sol está sempre brilhando (“shining”).
MP: Este foi seu primeiro single em três anos. Por que lançá-lo agora?
Nevin: No ano passado, eu e minha banda, Fairground Attraction, nos reunimos após 35 anos sem tocar juntos. Nossa separação foi bem traumática, parecia improvável que um reencontro acontecesse um dia. Por isso, ficamos muito felizes por termos conseguido. Fomos ao Japão e fizemos cinco shows, gravamos um álbum muito bem recebido e fizemos uma turnê pelo Reino Unido com catorze apresentações, incluindo uma noite memorável no Royal Festival Hall, em Londres. Nosso último show foi em Edimburgo, em outubro, e, quando acabou, tive aquela sensação de “cair de um penhasco”, sabe? De repente, me vi pensando: E agora, o que fazer? As músicas novas vieram rápido, e eu decidi lançá-las uma a uma, à medida que fossem ficando prontas, em vez de esperar concluir um álbum, como era o costume. Shining On The Hill é a primeira de quatro músicas que vou lançar este ano. A segunda é Humility With Style, que tem um clipe bem mais simples, gravado no jardim de uma casinha em Somerset, pertinho do Festival de Glastonbury.
MP: Isso é um prenúncio de um novo álbum que está por vir?
Nevin: Em algum momento, vou reunir todos esses singles num álbum, mas tudo mudou hoje em dia. É melhor fazer assim, com lançamentos em cascata – ou waterfalling, como chamam – do que esperar um disco completo. Isso faz mais sentido no mundo do streaming.
MP: Você tem um currículo e uma carreira impressionantes. Como é fazer música nova hoje em dia, comparado à época em que começou?
Nevin: É muito diferente! Hoje é um processo mais solitário. Antes, tudo girava em torno de juntar gente para gravar e tocar ao vivo. Agora, boa parte do tempo se passa sentado diante de um computador, mexendo em edições, experimentando tecnologias. Depois, você continua no computador, enviando arquivos ou criando vídeos para o TikTok, gerando “conteúdo”. Tento não ser nostálgico com o jeito antigo de fazer as coisas, porque seria inútil: Yudo muda, e eu gosto dos desafios que o mundo contemporâneo impõe. Em muitos aspectos, é bom poder fazer tantas coisas sozinho. Posso simplesmente seguir em frente.
MP: O que te inspira a compor hoje?
Nevin: Desde que me lembro, sempre fui movido por uma busca pela “verdade”. Vivo lendo, pensando e conversando sobre o que nos faz funcionar, o que nos move. Escrever músicas sempre foi meu jeito de tentar entender o sentido da vida. Quando eu era pequeno, minha mãe costumava ler para mim as parábolas da Bíblia, e eu adorava aquela sensação boa e acolhedora que sentia ao compreender a sabedoria por trás das histórias. Recriar esse tipo de sentimento, em mim e no ouvinte, sempre foi meu objetivo — embora eu só tenha percebido isso claramente há pouco tempo. Gosto de condensar sabedoria em uma canção simples, como The Beatles fez em Let It Be ou Hey Jude. Sempre preferi esse tipo de música às letras longas e verborrágicas de Bob Dylan. Eu tinha medo de um dia ficar sem ideias, mas, quando David Bowie morreu, percebi que o que nos falta não são ideias, é tempo. Eu amo escrever canções, e vou morrer com um violão nas mãos. Como disse Dylan Thomas: “Não entre mansamente naquela boa noite”.
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