Entrevista: Maglore

foto por duane carvalho

Maglore é a soma de tudo isso que aconteceu nos últimos dez anos, é resultado do trabalho na Internet. A gente juntou público fazendo show, mas muito veio de blogs, sites e agentes que colocaram a gente aqui. Não foram só quatro pessoas no palco que fizeram isso” – nas palavras de Teago Oliveira, vocalista e fundador do grupo, estas comemorações de sua primeira década fazem mais sentido quando celebradas em coletivo.

Daí o show que a banda baiana radicada em São Paulo fará em 25 de janeiro no Cine Joia (SP), com músicos convidados e participação de Helio Flanders (Vanguart). Neste papo com o Música Pavê por telefone, o cantor e compositor comenta um pouco dessa ainda breve história.

Música Pavê: Maglore é uma banda que está em constante mudança, cada disco representa uma fase diferente até mesmo na formação. Como é comemorar dez anos de aniversário de um projeto que, mesmo já consolidado, sempre é “novo” de alguma forma?

Teago Oliveira, Maglore: Bicho, sei lá, a gente não tinha como prever as coisas que aconteceram, né? A gente só se deu conta do passar dos anos quando chegou até aqui. A banda teve uma história de muita sorte, de períodos muito conturbados também – a gente azarou demais no caminho. A gente foi uma banda que viveu a grande transformação do circuito independente, daquela fase ali de 2009 quando estava tudo se formando, até os próprios blogs e portais, muita coisa começou naquela época, então a gente é praticamente a geração 1 dessa mudança de cenário. A gente tem um sentimento de gratidão mesmo por estar presente e por fazer parte de um momento tão bonito como a música brasileira tá hoje, porque a gente viu infelizmente muitas bandas e artistas que, por alguma pedra no caminho, acabaram ficando pra trás e interromperam as carreiras. Então, a gente se sente com muita sorte de ter conquistado esse público que a gente tem, que é quem nos dá motivo pra gente continuar, pra buscar a estrutura que Maglore tem hoje. Foi uma longa e dura caminhada, mas a gente colheu algumas vitórias bem legais no meio do caminho.

MP: Essas frases vieram quase todas com verbos no passado, mas a gente sabe que o que o futuro reserva também terá suas dificuldades, mas também bons frutos, não é?

Teago: É, tudo fruto de muito trabalho, de muita pesquisa também. A nossa geração é muito apaixonada e dedicada a viver o que gosta, a transformar a realidade. Então eu concordo pra caralho com você, tá sendo e ainda tem muita coisa pra fazer.

MP: Você citou esta geração, e a gente aqui teve o prazerzão de colocar Maglore como uma das melhores bandas desta nossa geração em uma lista que repercutiu muito bem. As pessoas sentiram falta de um nome ou outro ali, mas, no geral, todos entenderam que fazia sentido a seleção. E Maglore é um grupo que é citado de vez em quando como inspiração para novas bandas. Como é para você ser citado como referência para os novos artistas que estão surgindo?

Teago: Todos nós ficamos muito felizes com a lista, nos sentimos muito agradecidos por sermos reconhecidos dessa forma. Como você falou, uma ou outra sempre fica de fora, não significa que as melhores são só aquelas ali, mas é um apanhado que dá para fazer, né? Mas foi um grande barato estar fazendo parte disso. Tem tanto artista hoje no Brasil, e ver que a gente está tão dentro dessas coisas dá um gás, saca? A gente está em um ponto em que a música se transforma e tudo vira do avesso em cerca de seis meses, tudo vai mudando de uma forma muito louca, então a gente tá fazendo parte de um período que eu acho muito bonito na música brasileira, de forma geral. Eu conheço todo mundo dessa lista, são pessoas que, como nós, estão ali no dia a dia com o desafio de fazer música, que, ao mesmo tempo que é engrandecedor, é de tirar os miolos da cabeça. No Brasil que a gente vive, é um negócio de doido, você é mal visto pela sociedade, é uma bagunça. 

MP: Por falar nisso, a presença de Helio Flanders no show de comemoração dos 10 anos da banda é uma informação que instantaneamente me fez muito sentido. Isso porque, para além do grande artista que ele é, Helio é alguém que sabe o que é carregar tudo isso que estamos comentando e sabe o valor de celebrar um marco desses na história da banda. Conta um pouco sobre o que é para você tê-lo ali no palco com vocês?

Teago: Bicho, Helio é a figura central no desenvolvimento da Maglore em São Paulo, o cara que salvou a banda ali em 2012/2013 participando dos shows, ele vivia na casa em que morávamos, via o clima que não era muito legal por falta de show, falta de estrutura. Eu lembro quando o chamei para participar de um show e ele mandou uma mensagem dizendo “não te conheço, mas acabei de ouvir o Vamos pra Rua e é de cair o cu da bunda, é claro que eu vou fazer”. Foi isso mesmo, ele salvou Maglore quando a coisa estava pra degringolar, pra acabar mesmo, colocou a mão na massa e chegou a fazer show que, sem ele, seria impossível fazer, foi um cara que colocou a gente em contato com a Deck, que pegava no braço e falava “você vai sair na noitada para conhecer as pessoas”, ia me apresentando para outras pessoas… Sem ele, a gente estaria agora uns quatro anos atrás (risos). Helio é um cara que canta pra caralho, toca tudo, se diverte fazendo música… ele é apaixonado, é aquela figura romântica do século 19 (risos). Além de ser um grande compositor, ele tem as músicas mais lindas. Artista enorme, de coração e de talento. Onde eu for, quero que Helio vá junto.

MP: Por falar em compositor, a sua música que Erasmo Carlos gravou vai entrar oficialmente no repertório do show agora, mas eu desconfio que eu já vi essa ao vivo…

Teago: Pois é, a gente vinha tocando ela sem avisar, o público ficava confuso (risos), mas tinha gente que sacava. E agora ela vai entrar pro repertório da banda.

MP: Acho significativo demais também comemorar dez anos de banda sabendo que um dos motivos de celebração é ter sido gravado por Erasmo Carlos.

Teago: Exatamente. Essa música estava no Todas as Bandeiras, a gente tirou essa e outra música – eram doze no total – pra gente lançar depois como single, como clipe. Aí veio essa história do Erasmo, ou seja, deu muito mais certo do que a gente imaginava (risos). E agora a gente vai colocá-la no show porque a gente vai lançar a versão original, gravada em 2017, muito em breve. E além disso tudo teve Gal, né? Isso aí me enlouqueceu de vez. Gal colocou Motor, do Vamos pra Rua, no repertório do show dela. Tudo a ver ela cantar essa música, mas pra mim foi uma loucura. São carimbos de que a gente, nesses dez anos, deve ter acertado em algumas coisas (risos).

MP: Por consideração a você, não vou pedir para tentar me explicar o que é ouvir Gal Costa cantando sua música (risos), mas tem uma questão que eu queria muito conversar com você. Já me peguei diversas vezes, e observei pessoas ao meu redor, tentando explicar o som que Maglore faz e acaba saindo algo como “música-brasileira-contemporânea-de-banda-com-uma-pegada-tipo-Skank” (risos). É estranho receber classificações tão diferentes para seu trabalho?

Teago: (risos) Bicho, eu adoro Skank, fico feliz pra caramba. A música hoje em dia é tão vasta que ela é sub-sub-sub-segmentada, então você tem artistas que têm mais estilo musical dentro do release do que qualquer outra coisa. Maglore é uma banda que toca… exatamente o que você falou (rosos), não tem como fugir muito disso. Muita gente também compara a Paralamas do Sucesso, a banda de pop rock – geralmente é uma galera mais velha que fala isso -, também a uma coisa mais Los Hermanos, porque a gente vem daquele lugar, a gente tem as mesmas referências, enfim, vem da canção popular e a gente, por curtir muito música, consegue fazer soar atual, sem aquela cara de one hit wonder, aquelas que ficam presas no tempo porque ficaram datadas, né? Mas a gente tem essa paixão por fazer canção pop. Obviamente não estou me comparando a ele, mas eu vejo John Lennon ou George Harrison. Quando começaram, era muito o pop iê iê iê, e é engraçado ver como essas coisas se repetem com todo mundo. Quando a gente se propôs a fazer Maglore, saiu um primeiro disco muito adolescente, afinal, eram músicas que eu fiz quando tinha 17/18 anos. Depois de um tempo, quando comecei a entender mais o papel da música pop, fui entendendo que as músicas pop do John Lennon eram mais pop ainda do que as do começo da carreira, com uma sofisticação que o tempo dá. Acho muito simples o que Maglore se propõe a fazer: Música contemporânea voltada para a canção popular. Eu cresci ouvindo isso, e hoje eu não me proponho a fazer nada que não seja meu. Não tento fazer algo que seja alterna, vanguardista. Eu deixo isso pra quem é bom pra fazer isso, deixo isso pra Maria Beraldo, não tem ninguém melhor do que ela pra fazer isso no Brasil.

MP: Voltando ao assunto do Veroz, eu consigo interpretar sua discografia até agora como um movimento pendular que ora está em questões apaixonadas (como você falou), mais individuais – como Veroz e III – para, em seguida, tratar mais do coletivo (Vamos pra Rua e Todas as Bandeiras). Seguindo essa lógica, o próximo disco seria novamente dos de questões mais íntimas, mas pensei aqui que talvez, vide o momento que vivemos, haja uma urgência maior para olhar mais para o todo. Enfim, são só interpretações. O que você acha que virá no “próximo capítulo” da discografia?

Teago: É exatamente isso, você traçou e meio que já respondeu tudo. O iê iê iê do primeiro disco se repete muito pouco nos outros, mas o III volta com a mesma vibração, das músicas serem mais românticas. Os outros são escapadas do universo pop, embora sejam pop sim, e esse é um caminho dessa formação, com Léo e Lucas nas guitarras. É mais escapatório, uma fuga maior das obviedades. A gente enquanto banda cria formas de fazer músicas em que as interpretações sejam livres, a gente gosta disso. Acho que o próximo vai ter essa coisa mais apaixonada com elementos que façam essa dispersão dentro das canções. Não dá pra repetir a mesma paixão do III nem a do Veroz, mas é um disco que vai apontar de novo a uma outra coisa, até pra gente não repetir a fórmula do Vamos pra Rua e do Todas as Bandeiras – que são discos que se linkam mesmo, é como se um fosse o resultado do outro, são irmãos, assim como III e Veroz. Então, acho que o quinto álbum vem possivelmente como um ponto final nessa temática. Acho que, depois dele, a gente vai explorar outras sonoridades, outros instrumentos. É difícil responder, mas acho que ele vem, dentro da sua lógica, apaixonado botando o dedo na ferida (risos).

MP: Pra acabar, então: Vocês lançaram até hoje discos de dois em dois anos. Esse quinto álbum sai em 2019?

Teago: A gente está naquela fase de comemorar os dez anos e parar de produzir de dois em dois. Tem meu disco [solo] também neste ano. Se bem que na Maglore é assim, tudo é decidido aos 45 do segundo tempo. Se a gente se reunir agora em março e sair alguma coisa, a gente lança um disco agora. Mas a gente não tem planos pra isso não, fica pra 2020. E, cá pra nós, cinco discos… o negócio já começa a… sei lá, não sei se a gente faz mais quatro não (risos). A gente comemora dez anos, porque não é toda banda que faz dez, e não é qualquer banda que faz vinte. Estamos ficando velhos, né? Esse ritmo de fazer disco de dois em dois anos sem perder a qualidade é um desafio cada vez maior, a gente sabe que vai ter que colocar o pé no freio a qualquer momento (risos).

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