Diretor: Ninian Doff
Como de costume, o Music Video Festival convidou um nome estrangeiro de reconhecimento no mundo dos clipes para participar da edição do evento. O convidado da vez foi o britânico Ninian Doff, que falou ao Música Pavê nos bastidores do festival, após assistir no telão a uma sessão dos videoclipes concorrentes na premiação.
“Sou muito fã de videoclipes, além de ser alguém que trabalha com isso”, ele enfatizou durante a conversa, cheio de bom humor e empolgação por participar de um evento com propósito de mostrar um pouco da produção contemporânea no Brasil e no mundo. Conheça um pouco de seu trabalho.
Música Pavê: Como você começou a trabalhar com clipes?
Ninian Doff: Eu sempre trabalhei com cinema e vídeo, fazia edição e motion graphicsi, e tentava sempre fazer curtametragens. Estava desiludido, porque eu ia a festivais de curtas e percebia que as pessoas não se empolgavam com as produções, e eu também já não me animava muito. Isso foi há uns cinco anos, quando os clipes voltaram a ser muito, muito interessantes com gente como The Daniels, Megaforce e Patrick Daughters. Todo mês, saía pelo menos um clipe que era muito criativo, e isso me inspirou, eu disse “esquece os curtas, quero fazer clipes”. É nesses vídeos que eu vejo os trabalhos mais legais. Daí, comecei a fazer uns videoclipes sem orçamento, contactava músicos e pedia pra fazer seus vídeos e, de vez em quando, alguém aceitava. Daí as pessoas começaram a prestar atenção no meu trabalho e mais oportunidades aconteceram. Agora, estou nessa de “dane-se o resto, eu quero fazer é clipes” (risos).
MP: Uma vez ouvi um conceito interessante, de que um arquiteto era um artista à espera de alguém que financiasse sua loucura, e tendo a pensar que o mesmo acontece com um diretor de clipes.
Ninian: (risos) Sim, é verdade. E acho que a vantagem que temos, com as facilidades de trabalhar em vídeo hoje em dia, é que os clipes são bastante democráticos, no sentido criativo. Se você tiver uma ótima ideia e gravá-la com seu celular, as pessoas vão vê-lo na Internet. Eu posso ir a um parque com meus amigos e gravar alguma coisa, depois fazer os motion graphics em casa com os softwares, ao contrário de um arquiteto, que não pode sair por aí construindo prédios.
MP: Como fã de clipes, o que te atrai nessa linguagem?
Ninian: Pois é, mesmo trabalhando com clipes, ainda me considero um grande fã. Acabei de ver a exibição de vídeos aqui no m-v-f-, me perguntaram antes “você quer mesmo ver todos os videoclipes de novo?”, mas não é sempre que você tem a chance de ter essa experiência no cinema. É nesse universo que estão as pessoas mais criativas hoje em dia. Ao mesmo tempo, percebo que não dá para você ser preguiçoso na produção, porque é muito fácil as pessoas pararem de assistir ao seu vídeo e fazerem qualquer outra coisa.
MP: Para você, o que faz um videoclipe ser ótimo?
Ninian: Eu acho interessante como eles podem ser diferentes. Acontece de às vezes olharmos para um clipe e falarmos “uau, eu nunca vi isso antes”, a ponto dos diretores estarem ainda inventando técnicas. Eu era obcecado por essa ideia, em parte por culpa de Michel Gondry, ele sempre inventava alguma coisa. Ultimamente, tenho ficado impressionado mais com a narrativa e a fotografia, e menos obcecado pela originalidade (risos). Hoje em dia, acho que você sabe se um videoclipe é bom mesmo se você está vendo ele na Internet e chega até o fim (risos), “uau, eu vi um clipe inteiro por três minuros e meio, ele deve ser bom demais”.
MP: Imagino que você tenha crescido assistindo a clipes. Quais eram os seus favoritos?
Ninian: Quando eu era criança, Michael Jackson e seu Black or White é a primeira lembrança que eu tenho do videoclipe como um verdadeiro evento: ia estrear na TV às nove da noite, a escola inteira ia ver e comentar no dia seguinte, e um cara conseguiu gravá-lo em VHS… Anos depois, saiu uma série em DVD chamada The Director Series com Gondry, Spike Jonze e Chris Cunningham, eu tinha os DVDs e assistia a todos eles obcecadamente o tempo todo. Aí eu converso com outros diretores de hoje e todos eles também assistiam a essa série, acho que os produtores não imaginavam que estavam prestes a mudar a história (risos).
MP: Quanto a linguagem musical é em si visual, na sua perspectiva?
Ninian: Para mim, música é muito visual. Eu não gosto de criar um script com uma historinha baseada na faixa, eu acho que todos os clipes que eu já fiz são uma resposta minha para aquela música.
MP: Como é seu trabalho junto às bandas? Acontece dos músicos darem ideias para os vídeos?
Ninian: É engraçado, acho que as pessoas não entendem a folga com que eu trabalho. É raro os músicos me ligarem com uma ideia, ocasionalmente até me reúno com eles para discutir algo, mas o que mais acontece é me falarem “este é o orçamento, você vai saber o que fazer com ele”, e só isso. É raro ser um processo colaborativo, o que mais acontece é eu fazer tudo, depois apresentar para eles na esperança que eles gostem (risos).
MP: E o que você acha dessa dinâmica de demanda de produção?
Ninian: É estranho, eu disse outro dia para alguém que me falou que queria fazer clipes que uma coisa importante para se ter em mente é o quanto você vai ter que lidar com rejeição. Sem exagero, eu já trabalhei umas cem ideias para os mais ou menos vinte videoclipes que já fiz. Por muito tempo, a proporção era de apenas uma em cada dez ideias que eu tinha conseguia ser produzida. E você, às vezes, nem tem resposta. Você passa semanas preparando referências de imagens, faz uma apresentação linda, fica sonhando com o produto final e não ouve nenhum feedback, aí você entra no YouTube um dia e se depara com um vídeo para aquela música, aí pensa “tá, acho que não rolou” (risos). Com o tempo, isso melhora, mas é muito difícil quando você está começando.
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