Com Disco “Rosa”, Samuel Rosa É Mais Um Novato na Carreira Solo

Duas horas antes de Rosa chegar às plataformas de streaming, Samuel Rosa realizou a estreia das novas músicas ao vivo na aconchegante Casa Rockambole, em São Paulo, em um evento para convidados. Acompanhado de banda completa (incluindo metais), ele tocou o disco na íntegra em um ambiente muito diferente dos estádios com que acabou de se apresentar na turnê que celebrou a discografia e honrou a separação de sua banda, a gigantesca Skank. De certa forma, aquela noite entre amigos era também um retrato do espírito da obra, que propõe uma aproximação mais íntima ao que o músico vive, pensa e sente hoje.

Dias antes, Samuel contou ao Música Pavê que está em um momento interessante de ser um veterano com conquistas que poucos alcançaram (“poucas bandas duraram 30 anos com formação original em período de plena atividade”, ele fez questão de lembrar), enquanto vive também o ineditismo da estreia em carreira solo. “Eu cogitei que o disco se chamasse Novato“, conta ele com um sorriso, “mas algumas pessoas próximas acharam que poderia ser um pouco irônico… eu não acho. Acho que seria interessante, porque eu me sinto assim em vários momentos, e é atrás disso que eu estou: Desse sopro de novidade, de juventude, de movimento. Tenho citado muito Nick Hornby, quando disse que às vezes ficava constrangido quando pegava o primeiro disco de uma banda nova e se apaixonava por uma das músicas, daquelas que você consome como se fosse um sorvete de flocos e come até acabar. Ele ficava com vergonha, achava que era uma coisa meio adolescente, e depois desencanou. Na época, quase com 40 anos, ele disse que viu que juventude era igual saúde: À medida que você envelhece, você perde, mas precisa ter um pouco para sobreviver. Fico me perguntando se não é isso que o novo te dá: Vontade de continuar vivendo, entusiasmo”.

“Para chegar a este lugar onde cheguei agora – disco novo, fui pai de novo depois de 23 anos -, teve muita dor, muita perda, muito fim (de banda e de relacionamento)”, explica Samuel, “e o disco, nesse aspecto, é autobiográfico. Minhas letras são metáforas das coisas que eu vivi e vivo.  Aí pensei em “novato” ou Rosa mesmo, que é a autoafirmação de estar sozinho, respondendo por meus próprios erros e acertos. Nesse ciclo final da minha vida, pretendo que seja assim”.

As músicas do repertório de Rosa foram compostas em 2024, muitas em janeiro, em uma seleção entre canções que ele escreveu sozinho e parcerias com músicos de diferentes gerações, como o mestre Carlos Renó e o jovem João Ferreira (da banda Daparte). “Comecei a musicar algumas das novas composições, mas vi que elas não faziam sentido para mim neste momento”, conta Samuel, “o que é curioso, porque com Skank eu não tinha esse filtro. Mas quis que eu me enxergasse nesse disco”.

Tanto para montar o repertório, quanto para a produção do álbum, o músico comenta que havia dois aspectos contra os quais não queria lutar, “porque seria jogo perdido”: “Primeiro é como apresentar algo agora totalmente novo e desconectado com o que eu fiz, se eu fiz durante 30 anos várias coisas – é claro, dentro do meu espectro. Então, tem umas coisas meio Garota Nacional, ou Mandrake e os Cubanos. Aí tem outras mais Dois Rios, Resposta, meio Clube da Esquina, meio britpop, meio The Beatles, tem canções folk… Enfim, Skank passeou por vertentes díspares ao longo desses anos todos. Foi mais por atender a uma demanda nossa do que de achar que o público já está cansado de ouvir alguma coisa. Quantas bandas duram 20 ou 25 anos tocando a mesma coisa, não é? É como se o público fizesse um pacto de ‘você não muda e eu não te abandono’ (risos)”.

“A outra coisa contra a qual eu também não consigo lutar é que o que eu produza agora não guarde nenhum parentesco com o que eu fiz por 30 anos. Parece com Skank? É o mesmo compositor, a mesma voz (risos). Eu não saí da banda para fazer um disco de pagode, ou de jazz. Eu queria só me exercer sozinho. 30 anos é tempo suficiente, o ciclo está cumprido. Poucas bandas duraram 30 anos com formação original em período de plena atividade, sem nenhum ostracismo. Eu fui compondo, as coisas foram saindo, umas remetem a outras… mas, cara, acho que ainda dá para ser muito explorado dentro do limite que tenho como compositor”. 

Um dos territórios musicais que Samuel quis explorar em Rosa é essa “bossa pop”, “esse viés Sergio Mendes com Brazil 66, meio Marcos Valle e Azymuth também, que eu adoro”. O estilo está presente em Segue o Jogo, faixa que inaugurou a divulgação do álbum, e em sua “irmã” Segue o Jogo, que o compositor diz ser sua favorita do disco. “Eu queria um The Last Shadow Puppets tropical, meio trilha anos 1960, meio Jovem Guarda para um refrão Erasmo Carlos. Acho que ele ia gostar, porque uma vez ele disse que se fosse uma banda, ele queria ser Skank”, comenta ele.

Ao pensar no legado que o grupo deixa para as pessoas, e o desejo do público de ainda escutar essas canções ao vivo, Samuel comenta ter sido um privilégio ser o compositor de muitas delas. “[Há uma] demanda pelas clássicas, é por elas que se dá aquela comunhão”, comenta ele, “vira uma trilha sonora importante de uma fase na vida da pessoa. E a música é para isso também. Eu adoro escutar umas coisas que me levam lá para trás, como olhar um álbum de fotografias”.

E como é olhar hoje para o Samuel Rosa de antigamente, pela lente do repertório que fez com Skank? Ele explica que a experiência é frequente: “Todo final de semana, eu revisito o Samuel dos anos 1990, esse outro eu de outros tempos. Estou sempre revisitando esses segmentos do que fui como compositor e intérprete. Sei que estou começando a construir uma nova etapa, e leva tempo até que ela tenha corpo. Mas vou com calma, está muito divertido”.

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