Benito di Paula: “Estou cantando para uma terceira geração”

Ao lado do filho Rodrigo Vellozo, músico conta sobre as comemorações de seus 80 anos com novos discos, como recém-lançado EP "Madrugada"
foto por murilo avesso

Benito di Paula é uma lenda viva da nossa música, um compositor cujo repertório faz parte do cancioneiro popular brasileiro, com uma estética que influenciou do samba contemporâneo, com caráter vanguardista, àquilo que hoje conhecemos como pagode – termo que ele viu nascer com as rodas de música na casa de seus pais. E seu legado é celebrado hoje com o projeto Benito 80, com gravações de artistas que têm seu nome como referência, direta ou indiretamente, em seus trabalhos.

“Eu não sei fazer música brasileira”, brinca ele em entrevista ao Música Pavê, “o que faço não é exatamente samba, é um ritmo latino americano. Porque, sem querer, eu juntei o piano, um surdo, um tumbadora – que é um instrumento tipicamente cubano – com timbales, um contrabaixo e um pandeiro”. Ao explicar melhor seu estilo, Benito relembra: “Quem ia muito me ouvir era Vinicius de Moraes. Eu ficava feliz da vida. Um dia, nós nos encontramos – porque, quando ele chegava, eu estava tocando e, quando parava de tocar, ele ia embora -, encontrei com ele na porta e ele falou: ‘Eu adoro essa batucada que você faz no piano’. Aí eu fui sacar que ele sacou que eu sambifico a música cubana (risos)”.

“Meu pai pensa o samba de uma maneira muito livre, de uma maneira quase como se nem fosse samba”, conta o filho e parceiro musical Rodrigo Vellozo. Ao lado de Rômulo Fróes, ele dirige o projeto Benito 80 e também participa como músico. “Tivemos que repensar a obra do meu pai como um todo, porque ele não é o tipo de artista que tem aquela obra lá [no passado] e não tem nada agora”, explica Vellozo, “ele está sempre vivendo o momento presente. E [a intenção era] colocar isso com a estética da minha turma de músicos de hoje, daqui de São Paulo, o pessoal que eu conheço, porque eu sempre vi um paralelo entre a cena da qual meu pai fez parte e a de hoje, principalmente do samba”.

João Bosco, Teresa Cristina, Mariana Aydar, Rodrigo Campos e a nova formação do lendário Demônios da Garoa (com quem Benito tocou no passado) são os convidados do EP Madrugada, lançado na última semana, “o primeiro movimento do concerto” – nas palavras de Vellozo. Ele introduz um álbum de novas versões que sairá ainda neste semestre (e contará com gente como Criolo e Juçara Marçal), que, por sua vez, foi pensado inicialmente para vir ao mundo junto a Infalível Zen, lançado em 2021, o primeiro disco de inéditas de Benito di Paula em 25 anos. Os músicos convidados, que revisitam composições icônicas do artista, foram escolhidos “de maneira intuitiva”, como explica Vellozo: “Eu fui sonhando com essas músicas, que fazem parte da minha vida de uma forma diferente, porque eu nasci no meio delas, é como se elas fossem minhas irmãs, todas filhas do meu pai também (risos). E fui sonhando também com os artistas que eu imaginava. E quisemos também vozes femininas, porque a persona do meu pai às vezes vem à frente da música, com uma virilidade na música que logo é ligada ao masculino. Então, elas vêm e acrescentam algo novo”.

Ao ser perguntado sobre o que aprendeu ao revisitar hoje esse material de Benito, Rodrigo responde: “O que é meu pai? É essa pessoa que produz, que fez essa obra que penetra em diversos lugares que a gente nem imagina. Quando você vê como João Bosco toca, ou Rodrigo Campos, você vê como sua influência é muito mais ampla na música popular brasileira. Se o pessoal hoje coloca o cavaco com distorção tocando samba, bebe de um certo espírito que o meu pai e a geração dele plantaram lá”.

Assim como eles trabalham juntos sendo pai e filho, ambos afirmam que a popularização da música de Benito se deu por “transmissão familiar” – algo que os músicos convidados concordam. “Meu fã comprava meu disco e mostrava para os filhos”, conta o próprio, “então, eu estou [hoje] cantando para a terceira geração. Ele mostra para o filho, o filho mostra para o neto”.

“Eu demorei a entender que meu pai tem 80 anos, porque, para mim, ele é muito jovem (risos)”, diz Vellozo, que é interrompido pelo pai, que retruca: “Mas eu tenho oito anos (risos)”. Ele explica: A idade vem pra todo mundo, não tem como. O que você tem que manter jovem é o seu espírito e viver o momento, mas sem esquecer o passado bom”.

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