As Músicas Brasileiras Mais Bonitas de 2024
Toda fala sobre música tem em si alguma subjetividade, consequência natural do fazer artístico e seus valores imateriais. Da mesma forma, as seleções que fazemos já nascem da condição que dita que todo vocabulário é passível do mais alto grau de interpretação.
Em outras palavras: Apontar as músicas brasileiras mais bonitas de algum ano é um exercício de pensar o significado da beleza expressa naquele período. E, como uma atividade já tradicional no Música Pavê, é poder anualmente recalibrar os conceitos que são base no diálogo sobre a canção brasileira, e relembrar o prazer que é abraçar esse subjetivismo.
(Veja também as listas de músicas brasileiras mais bonitas de 2023, 2022, 2021, 2020, 2019, 2018, 2017, 2016, 2015, 2014, 2013, 2012 e 2011)
Veludo Marrom, por exemplo, faz pensar o quanto uma música pode ser um verdadeiro acontecimento. Há muito em sua narrativa, de momentos mínimos na timbragem até uma explosão orquestral que redefine o que entendemos por “clímax” em uma canção. Guiada pela interpretação sempre potente de Liniker, é uma música que não consegue se esconder da atenção de quem escuta Caju – o que não é fácil em um disco que aposta em uma experiência de muitos estímulos.
Já quando Almério convidou Maria Bethânia para Quero Você, a direção é quase oposta. Trata-se de uma canção com os dois pés na tradição do “vozes e violão”, mas a interpretação dos dois cresce de tal forma que a memória registra instrumentos fantasmas, porque é difícil acreditar que só eles ali consiguiriam criar um volume sonoro tão grande. Mas há força de sobra nos versos sinceros e no canto emocionado de uma música que já nasceu clássica.
No caso de Um Sorriso de Adeus, Flávio Vasconcelos contou com “atos” bastante diferentes dentro de uma mesma narrativa, evocando diversas sonoridades com o violão e sua voz como base. A faixa desenvolve sua narrativa com a produção caprichada de Rômulo Fróes e a melancolia do cantor e compositor, uma qualidade que transita entre o clássico e o despojado. A propósito, ela chegou ao mundo em primeira mão no Música Pavê, um orgulho que ninguém nos tira.
Liniker aparece novamente nesta lista, agora como compositora de Deságuo para Emergir, que o grande Zé Manoel gravou para seu recente CORAL. Assim como na faixa acima, a canção versa de um amor que hoje é apenas ausência. A tristeza pertinente a esse fato desenvolve sua complexidade na doçura da interpretação de Zé e na delicadeza com que os timbres constróem a melodia.
“Eu quero viver” é o verso que ecoa com a voz de Bebé na faixa que encerra seu excelente SALVE-SE. Outra música que traz em si momentos bastante específicos dentro de sua narrativa, Eu Quero Viver expressa a vitalidade de quem confronta sombras, vozes e medos e conclui que, mesmo sem “tempo de me amar direito”, o que lhe cabe é querer estar bem. É quase uma crise de meia idade aos 20 anos traduzida em uma grande música, outra que se encontra esteticamente entre um passado nostálgico e um futuro que já começou.
Por falar em clássico, O Amor poderia ser uma regravação/tradução qualquer se realizada por outros músicos. Nas mãos, voz e coração de Alice Caymmi, é outra faixa com status de acontecimento. Há algo que acontece no corpo inteiro ali em dois ou três momentos da música que não é tão simples descrever, mas que é bem conhecido por quem mergulha na faixa. Sereíssima, ela nos dá todo um oceano para esse batismo com cara de afogamento (ou vice-versa). A propósito, seu vídeo também veio ao mundo primeiro no Música Pavê.
No quesito pop romântico, foi difícil não se deixar apaixonar pelo dueto Bryan Behr e Duda Beat na singela Azul. Outra canção que parece se inspirar em outros tempos, ela parece se orgulhar de uma doçura romântica popular (aquela vibe deliciosamente “mela cueca”) para entregar um refrãozão cantado a dois – daqueles que nos fazem acreditar que amar é fácil. É pop por excelência, e bonito demais de escutar.
O que IVYSON fez em Serena foi produzir uma canção romântica cujos pés estão fincados no contemporâno – não tematicamente, mas em toda a estética que acompanha a faixa. Há ecos das músicas de amor mais tradicionais, como as duas acima, mas seus beats e até a métrica revelam uma beleza cheia de frescor. É um tanto do que esta nova geração tem de melhor, sem desconsiderar seus antepassados.
E por falar em gerações, as duas músicas que fecham a lista têm um (baita) nome em comum: Arthur Verocai. Ele empresta seus arranjos orquestrados a Apazigua, um dos grandes destaques do que Tuyo construiu no ótimo Paisagem. É uma faixa que sabe acompanhar a paz descrita na letra, sobre quem sabe que “não é todo dia que a gente segue em frente pra recomeçar”, mas não se inibe dessa jornada.
E Silva encerra esta seleção com a delícia que é Girassóis, faixa que não dá nome ao disco Encantado, mas define sua capa – e muito de nossa experiência com ele. Verocai, mais uma vez, adiciona volume, vida e sorrisos à interação de piano, baixo e bateria, enquanto o vocal arroucado brinca com substantivos e todo aquele espírito que nos faz amar a música popular brasileira.
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(Veja também as listas de músicas brasileiras mais bonitas de 2023, 2022, 2021, 2020, 2019, 2018, 2017, 2016, 2015, 2014, 2013, 2012 e 2011)
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