Arthur Nogueira: Música como Afirmação de Liberdade
“Penso muito como a arte, de modo geral, é política, como tudo aquilo que fazemos. E vejo que existem artistas que, diante de uma discussão necessária sobre representatividade, muitas vezes querem ignorar determinadas obras e artistas como se eles não fossem políticos e não estivessem contribuído por serem líricos, por não necessariamente serem ativistas. Tenho pensado muito nisso. Acho que a minha música é bastante política, porque ela é uma afirmação da liberdade”.
O paraense Arthur Nogueira falou ao Música Pavê às vésperas do lançamento de Salvador, segundo dos cinco singles que planejou para este semestre. Inspirada na capital da Bahia, a música traz conteúdo homoafetivo inspirado pelo carnaval da cidade e seu grande senso de liberdade.
Esta temporada de singles é um momento inédito na carreira e discografia do músico. ” Antes de qualquer coisa, sou um compositor, então eu confesso que prefiro a ideia de álbum completo”, conta Arthur, cujo último disco (Rei Ninguém, de 2017) foi todo “feito do zero, pensado como álbum mesmo, uma experiência que eu gostei muito. O encarte da edição em CD traz as músicas divididas em capítulos, porque elas para mim contavam uma história, tinham um enredo”.
Ele conta que a experiência de lançar músicas avulsas tem muito a ver com um movimento que ele nota nos artistas ao seu redor. “Nós, da geração anos 2000, somos uma espécie de cobaia”, ele brinca, “ninguém sabe no todas essas mudanças na maneira de consumir música vão dar de verdade. Então, eu me disponho a experimentar. Acho que se eu, como ouvinte, não consigo acompanhar tantos lançamentos e tanta informação musical, pode ser uma maneira das pessoas prestarem atenção a cada canção, e possam ouvir uma canção que vai mexer com elas sem necessariamente ter que ouvir um disco inteiro”.
O lançamento anterior, que iniciou a temporada de cinco singles para este semestre, foi Pontal, com Fernanda Takai. Arthur, fã de Pato Fu desde a adolescência (“fui a todos os shows da banda em Belém”), conheceu a cantora em São Paulo há alguns anos e os dois seguiram em contato. “Eu cultivei uma relação até chegar a essa parceria, não foi algo motivado pelo fato de que ‘poderia ser um feat interessante’”, explica ele, “eu só propus isso a ela quando senti que ja tínhamos criado uma conexão”.
“Apesar de ser muito pragmático, objetivo e racional no momento em que eu vou trabalhar, a escolha das pessoas com quem trabalho é pela emoção mesmo. Eu não consigo pensar em fazer algo com quem não me emocione de verdade. Então, meus parceiros são todos colhidos nesse sentido. Pode ser alguém de quem eu vejo o trabalho e fico interessado, e um dia nos conhecemos, conversamos e rola essa química, ou são amigos mesmo. Eu tento não sucumbir à urgência do nosso tempo, gosto que as minhas relações sejam construídas”.
Em épocas de tantas urgências, e de tantas violências, ambos os singles chegam delicados, nostálgicos no contemplar de suas narrativas e paisagens. Há muito de Brasil ali, nesse trânsito entre rios, cidades e sentimentos, sem as raízes estarem em um só lugar. “Quem me acompanha já conhece o contexto das minhas músicas”, conta Arthur, “várias canções minhas falam sobre o não-pertencimento. Rei Ninguém é muito sobre isso”.
“Salvador e Pontal têm de fato uma história, é o indivíduo sendo mais importante do que uma comunidade. Minha relação com Belém é mais profunda, é como se eu fosse esse lugar. Eu seria outra pessoa se não tivesse nascido lá. Vai ter uma canção em parceria com uma poeta portuguesa, então esse trânsito vai além das fronteiras (risos)”.
Curta mais entrevistas no Música Pavê