Quarto Negro, cada vez menos Desconhecida

Foi em uma tarde quente e seca de fim de inverno que nos encontramos com Eduardo Praça e Thiago Klein, dois terços da banda paulistana Quarto Negro. Mesmo sendo a primeira vez que sentávamos com eles para conversar, eles já nos eram bem menos desconhecidos do que o título de seu primeiro e recém-lançado álbum sugere.

Ouvimos Desconocidos em loop por alguns dias não só pra produzir essa matéria, mas também porque não foi nada difícil sermos cativados pela beleza do trabalho dos caras. As onze faixas que compõe o disco são prova do amadurecimento quase precoce atingido através dos lançamentos anuais de EPs desde 2008 (Buu, Zoroastro e Bom Dia, Lua).

eduardo praça

Inquietos, os três rapazes (o baixista Fabio Brazil completa o trio) viajam bastante e já gravaram trabalhos nos Estados Unidos e na Argentina, daí não ser muita surpresa eles terem escolhido produzir o álbum em Barcelona. “Queríamos sair de São Paulo pra não termos distrações na hora de trabalhar, sem ter namorada ou o pai chamando para assistir ao futebol”, disse Eduardo.

“Nós somos muito americanizados, aí queríamos ir para a Europa experimentar algo diferente”. Tudo acertado com o produtor Marc Molas e o selo catalão Daruma Records, a banda se mudou para lá e começou o confinamento que gerou Desconocidos, morando no bairro Llucmajor (que deu nome a uma das canções do disco) e decidida a realizar um excelente lançamento.

Eles descrevem a relação com Barcelona como “amor e ódio”, entre risos e histórias sobre a cidade. Longe de ser um pólo para o Rock, a capital da Catalunha ajudou eles a encontrarem as referências dentro do seu próprio repertório, já que por si só não oferecia inspiração dentro do gênero. “E a banda ficou fortalecida, mais unida”, já que a experiência fez com que eles não só morassem e trabalhassem juntos, mas também dividissem o isolamento da família e amigos, a falta de dinheiro e as cervejas de 1 euro.

thiago klein

Só alguns meses depois do retorno à São Paulo que o álbum foi concluído, com a pós-produção feita à distância. “Isso atrasou bastante”, conta Thiago, “algo que seria feito em cinco minutos se estivéssemos lá, levava até dias pra ser concluído. Pedíamos alguma modificação por email, aí não voltava do jeito que queríamos; Às vezes a gente tinha que ligar e escutar por telefone para poder explicar melhor (risos)”.

O  lançamento do disco já vem acompanhado de dois clipes, Vesânia I (Cabo Horn) e Vesânia II (Delírio Mútuo). O primeiro foi feito em São Paulo, com direção de Daniel Barosa (que trabalha com a banda desde o início) e fotografia de Caio Perón, com a simples premissa de mostrar a Quarto Negro tocando. “Eu queria contar uma história de um raciocínio febril ao longo do álbum, e Vesânia seria o clímax, o delírio”, explica Eduardo, “e como as duas músicas são bem diferentes, a gente dividiu em I e II“.

Vesânia II (Delírio Mútuo) vem com outra atmosfera e outra história por trás. A balada, por si só, já se difere das outras do álbum com a presença marcante do violoncelo e a vibe não-linear do delírio (“É a que a gente mais gosta”, revela Thiago). Seu clipe também destoa como uma nova experiência para a banda. Ele foi feito pelo fotógrafo francês Mr.Chill, amigo de Eduardo, que convocou sua namorada, a modelo Marjo (a mesma parceria que gerou a capa de Desconocidos), para protagonizar o trabalho impressionante que ele criou.

Dentro da condição de não entender os versos da canção, ele criou uma obra de sensações. A câmera parada cria quadros meticulosamente construídos no quarto de hotel, enquanto a moça interpreta em pequenos detalhes a vibe da música em seus diversos momentos. Por falar em interpretação, é nessa faixa que Eduardo entrega seu melhor vocal – e não surpreende ouvir que essa é a favorita deles, muito menos a escolha dela ser lançada para divulgar o disco.

Depois de ouvir o álbum tantas vezes e escutar da boca deles que tiveram que olhar pra dentro de si mesmos para encontrar as referências para compor, perguntamos sobre a pessoalidade daqueles versos, que contam pontos de vista e histórias tão íntimas. Os dois riem. “As pessoas tem me perguntado bastante sobre isso”, diz Eduardo (que escreveu todas as letras), “mas as músicas não são necessariamente sobre mim. São sobre histórias que eu já ouvi, sobre amigos meus, filmes que eu vejo e livros que eu leio, principalmente os filmes e livros”, citando Woody Allen e Voltaire, entre outros.

O fato é que todas as canções são bastante humanas, demonstrando uma sensibilidade artística que não é fácil de ser atingida, principalmente quando se fala de coisas que não foram vividas em primeira-pessoa, o que acaba por revelar mais um pouco do talento deles. O capricho nas composições é outro, e a diversidade sonora que permeia o disco foi incluída a dedo para obter o que eles chamam de “um caráter único”, um som que pode ser comparado ao de várias bandas, mas que sempre oferece um lado muito próprio.

Os oito dias que separam nosso primeiro contato com a Quarto Negro e a publicação foram testemunhas de um número crescente de seguidores e fãs nas redes sociais, contagens de visualizações no YouTube e nas audições do disco (que podem ser feitas gratuitamente no Facebook), além de outras publicações (como em nossos parceiros Miojo Indie e Alive Through The Music). Os rapazes são cada vez menos “desconhecidos” e não vai demorar muito para serem notados por um público maior. Ficaremos atentos aos próximos passos deles, a começar pelo lançamento físico de Desconocidos (que também terá cópias em vinil) e futuros clipes, mas – por hora – ainda ouviremos o álbum em loop infinito por um bom tempo.

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