“Não Pense”, Mas Sinta: Jovem Dionísio Propõe Conexão e Transformação

foto por felipe fonseca

É tempo de pausa e transformação para Jovem Dionísio. Depois de viver momentos marcantes como a estreia no Lollapalooza, uma turnê pela Europa e a indicação ao Grammy Latino, a banda curitibana olha para o futuro com mais curiosidade do que pressa.

Seu novo single, Não Pense, lançado na última sexta-feira, 25/07, traduz esse estado de espírito: Um som que mergulha em atmosferas mais experimentais, entre camadas de sintetizadores, distorções de guitarra e sensações que oscilam entre a introspecção e o movimento. A faixa nasceu em etapas, a partir de um processo quase intuitivo no estúdio da banda, no qual os cinco integrantes imaginaram a construção antes de levarem a pré-produção ao produtor Gustavo Schirmer. O resultado mistura referências vintage e contemporâneas e cria uma textura híbrida, que se estende também ao clipe: Filmado em 16mm pelas ruas de Nova York, ele captura a nostalgia da película e a traduz para o agora.

Em entrevista ao Música Pavê, Gabriel Mendes (bateria) e Gustavo Karam (baixo) falam sobre a criação de Não Pense, o reencontro com Schirmer, as novas experimentações da banda e os caminhos que se desenham para o futuro.

Música Pavê: Não Pense tem uma mensagem aberta, que pode ser interpretada de diferentes formas. Como foi o processo de composição dessa música? 

Gabriel Mendes: Ela surge em um momento em que estávamos testando bastante com instrumentos e tudo mais. É uma música que parte de um sentimento meio confuso, né? Tipo “sai da minha cabeça”, realmente é um sentimento meio ruim, só que chega no refrão e tem aquele alívio, de “não pense que eu não penso em você”, com uns acordes mais tranquilos. Conseguimos construir bem isso no refrão, com várias vozes e um efeito mais aliviador. Demorou um tempo até entendermos em qual projeto ela iria se encaixar, porque fomos para Nova York gravar o clipe e pensamos “mano, qual música a gente faz?” (risos). Pensamos nessa música e na fase de produção, Ber viu que encaixava uma parte C e fez essa parte mais gritada, meio que um resumo, com algumas ideias a mais.

MP: A música traz uma sensação de intimidade, como se a gente estivesse ouvindo um pensamento em tempo real. Como vocês chegaram a essa atmosfera? A letra veio antes da melodia ou foi tudo sendo construído junto?

Gabriel: A ideia já estava meio que pronta, mas, na hora da gravação e de entender o conceito, foi feita em partes. Nos reuniumos no nosso estúdio, somente a banda mesmo, e ficamos imaginando umas baterias acústicas, guitarras, sintetizadores… imaginando e montando. Gravamos uma pré e depois levamos para Gustavo Schrimer, que trouxe essa nova roupagem. Então, foi uma mistura de várias coisas. Gostamos muito dos instrumentos e elementos que Schrimer coloca [nas músicas], como sintetizadores antigos com um barulhinho clássico, que traz uma roupagem daquela época. Mas gostamos de coisa moderna, a própria voz do Ber foi gravada em um microfone moderno. Então, teve bastante dessas brincadeiras porque gostamos de misturar coisas antigas com coisas novas e dá essa textura que até o clipe trouxe. É uma imagem antiga, de película. Mas, no contexto atual, com telões gigantes e celulares.

MP: Legal até vocês terem mencionado Gustavo Schrimer, porque vocês voltaram a trabalhar juntos nesse single, né? Como foi esse reencontro com ele no estúdio? 

Gustavo Karam: Acho que dá para dizer que Schrimer é um grande amigo nosso acima de qualquer coisa. Conhecemosele faz tempo, fizemos várias coisas juntos e achamos ele um gênio dos sintetizadores, dos sons e de fazer com que os elementos soem bem dentro da música, sem um roubar o lugar do outro. Ele é uma pessoa que, desde sempre, tem um bom gosto e boa noção dessas coisas. O nome dele acabou vindo às nossas cabeças quando pensamos nessa música e foi muito bom. A galera que escuta e conhece mais sobre ele também associa, falam, tipo: “nossa, tem bem a carinha do Schrimer, né?”. Então ele tem esse toque próprio, um tempero especial que a gente gosta também.

MP: Vocês comentaram que cada integrante teve uma responsabilidade específica na construção do novo single. Como foi esse processo mais individualizado dentro de uma criação coletiva?

Gabriel: Acho que toda música tem esse lado individual e o lado que construímos juntos. E acho que essa música é bem parecida com outras que já fizemos, em que chegamos com uma ideia inicial e conversamos entre nós mesmos sobre o que dá para virar essa música. O grande lance foi nos reunirmos algumas vezes, o processo sozinho aconteceu no início e depois andou junto conosco. Tivemos vários encontros no nosso estúdio para mexer no som, que mudou várias vezes, e depois nos encontramos com Schrimer, para finalizar.

Gustavo: Na real, é um negócio que estamos buscando fazer cada vez mais. Inclusive, foi um dos nossos métodos para gravar nosso primeiro EP, que é nos encontrarmos, colocar o computador para gravar e ficar tocando, para ver se juntos, cada um com seu instrumento, conseguimos chegar a algum lugar. Temos nos desafiado cada vez mais a fazer isso e nessa música teve um pouco mais dessa essência e temos curtido muito fazer isso, tocar sem saber o que vai sair.

Gabriel: Fora o estudo maior em cada instrumento. Teve um dia em que tocamos no [estúdio] do Schrimer e voltei para casa pensando que talvez pudesse mudar a bateria e o que estava acontecendo ali. Fiquei em casa gravando várias opções de bateria, gravei várias vezes até conseguir achar alguma coisa [que encaixasse na música]. No dia seguinte, já colocamos no projeto.

Gustavo: Às vezes você vai tocar junto e sai tudo lindo, mas às vezes é importante tocar junto para se saber que estava horrível e para ir para casa sozinho pensando em melhorar isso [risos].

MP: É bacana porque, nesse processo de se ouvir, vocês conseguem captar bem o que dá para melhorar e até para testar, né? Em produções futuras.

Gabriel: Exato, é uma coisa que evolui, né? Não é só colocar o que fizemos até hoje, é tentar fazer o que ainda não conseguimos fazer e ir aprendendo.

MP: Falando um pouco mais do clipe, a estética visual também chama atenção. Sei que vocês utilizaram uma câmera especial, de 16 mm, e queria saber com vocês como surgiu a ideia de registrar tudo em Nova York e como vocês pensaram a narrativa visual para a música?

Gustavo: Acho que esse foi o clipe mais diferente que fizemos até agora, né?

Gabriel: É, começando pelo fato que gravamos o clipe primeiro, antes da música estar pronta.

Gustavo: Foi o primeiro clipe que não ficamos escutando a música o dia inteiro [risos]. Normalmente, quando temos que aparecer mais, é o dia inteiro escutando música e aí tem a divisão de partes e tudo mais. Na real, para mim, foi bem legal de gravar porque, às vezes, é cansativo ficar o dia inteiro gravando, com troca de roupa, esperas e tal, e, para esse clipe, foi tudo descontraído. Estávamos andando, passeando e fazendo nossas coisas nessa viagem que estava bem legal e o Fon (Felipe Fonseca, diretor do vídeo) estava só captando as coisas. Acho que isso, de certa maneira, foi transmitido bem para o clipe. Às vezes, quando existe uma preocupação de gravar algo que você já sabe o que é, parece que dá vergonha e fica mais fácil de você travar, sabe? Dessa vez foi mais genuíno.

Gabriel: Sim, e aproveitamos a viagem que iríamos fazer para o Grammy, em Miami, e pensamos em ir para Nova York antes. Vamos ter poucas vezes uma oportunidade como essa, vamos aproveitar essa primeira vez. A primeira vez é única, né?. Fon é essa mente inquieta que gosta muito de explorar o conhecimento dele e ele sempre teve essa vontade de mexer com película e fazer clipe só de película. Ele é muito estudioso nisso, gosta de ver os equipamentos, o rolo, entende muito de revelação e ele já estava com tudo isso na cabeça na hora de viajar para lá. Ele deixou o material lindo e pronto para nós, tanto que produzimos a música sem saber que [o vídeo seria] para essa música. A estética fica bem legal porque fica com esse sentimento intenso, mas, ao mesmo tempo, é descontraído, porque é uma viagem, não era um clipe com horário e roteiro. É só a gente vivendo o máximo e Fon gravando o máximo e torcendo para o rolo da câmera ter gravado tudo, porque já fizemos clipe em que um rolo inteiro [de filme] sumiu. Mas faz parte da emoção, né? [risos].

MP: A escolha de filmar o clipe com uma câmera de 16mm trouxe uma textura mais orgânica, quase nostálgica, que conversa muito bem com o tom da música e a mensagem dela. Quando assisto ao vídeo, tenho muito essa sensação, é um trabalho muito bem pensado.

Gabriel: Com certeza, acho que ficou muito bonito. As imagens por si só, antes de ter música, ficaram muito bonitas e a música criou essa corpagem analógica, sabe? Com os elementos de eco, a voz um pouco mais lo-fi, um pouco mais para trás, e são várias vozes cortadas. Tem umas guitarras mais distorcidas também – é algo que não fazemos tanto e, nessa música, decidimos ser livres. Tem uns elementos de músicas antigas, como os sintetizadores meio estilo Pink Floyd, tem um piano reverb solto igual Led Zeppelin, também tem um delay de fita, coisa que a galera fazia também… Schrimer e Fon são pessoas absurdas que conseguiram entender essa imagem que a gente queria mostrar.

MP: A viagem pra Nova York, onde vocês gravaram o clipe, aconteceu em um momento especial: a indicação ao Grammy Latino. O que esse reconhecimento representou pra vocês, como banda e individualmente? Muita coisa, né?

Gabriel: Ah, sim, muita coisa, né? E ao mesmo tempo não representa tanto assim… É difícil dizer por que esse projeto vai [para a indicação] e por que outros não vão, mas ficamos muito agradecidos por quem esteve lá, escutou nosso som e achou que dava para encaixar com o som de outra galera para competir. Então, esse é o significado, da galera da Academia que conseguiu ouvir o álbum e nos colocou no mesmo patamar do resto das pessoas que já estiveram lá competindo. Agora, entendemos melhor o que é a academia, porque estamos como membro. Ela é muito grande, existe há muito tempo e serve para presentear e homenagear as pessoas que estão trabalhando na música. Acho que, entrando nisso, conseguimos profissionalizar cada vez mais a nossa vontade e cada vez mais deixamos de ser moleques para começarmos a sermos vistos como pessoas que podem ter uma significância legal na música. Esse selo traz esse marco e essa responsabilidade para a gente para os próximos lançamentos, porque estamos sendo vistos por essa galera também, então ficamos muito felizes de ver nosso trabalho ser reconhecido. Ao mesmo tempo, temos uma contradição sobre isso, porque parece meio: “Parabéns, nota sete, pode passar!”. Enfim, é difícil criar uma régua que vai medir artista, né?

Gustavo: É só uma das milhares maneiras de você categorizar algo, né? Tipo, eu com meus amigos podemos sentar e escolher entre nós qual é a melhor banda de rock.

Gabriel: Se for por quesito de votação, perdemos sempre, não tem como [risos]. Nunca ganhamos nada, mas competimos em várias coisas. Mas, quando é votação popular, esqueça. A galera tem um fã-clube gigantesco. Imagina competir com uma Ana Castela ou uma Anitta? 

Gustavo: Não temos chance, não dá certo [risos]. Mas o mais legal é que não nos estressamos com isso, sempre saímos dando mais risada do que quando entramos. Fazemos piada do tipo “somos os melhores perdedores em todos, vamo que vamo!” [risos].

MP: O fandom de vocês vai crescer mais ainda! Aliás, já tem crescido, né? Vocês estão experimentando novas sonoridades e abordagens visuais e várias pessoas se interessam cada vez mais. Isso deve se refletir em futuros lançamentos? O que vocês andam pensando para a nova fase?

Gustavo: Acho que o futuro de Jovem Dionísio vai ser exatamente um reflexo do que estamos vivendo hoje e boto fé que estamos buscando tudo isso que falamos, e vai dar para perceber isso no próximo disco. Estamos bem em um momento de trabalhar e levantar músicas, ideias, e coisas que gostamos e entender como essas músicas se comportam juntas.

Gabriel: Esse lançamento serve como um estudo do que vamos fazer mais para frente. Sempre vai ser isso, né? Exploramos o máximo de coisa que podíamos para entender o que gostamos na sonoridade, o que as pessoas gostam em relação as nossas músicas e entender o que vamos fazer daqui pra frente. É um espelho muito fiel para o que está vindo, sabe? Esse clipe mostrou muito uma despretensiosidade nossa, meio pretensiosa, porque é um clipe muito bom e que não tinha essa pretensão, apesar de ter tido uma pretensão inicial. Cai nesse paradoxo. Mas é isso que queremos mostrar cada vez mais: Mostrar para as pessoas que estamos aqui para continuar por bastante tempo, tem bastante coisa que queremos mostrar e colocar no cenário de hoje. Tem muita história que podemos contar e que as pessoas podem ouvir da gente, aí que mora nossa vontade de continuar fazendo música juntos e fazendo tudo o que tem que fazer para termos os melhores resultados possíveis mais para frente. Ainda estamos em uma fase inicial, de criação, nem sabemos muito bem o que vai sair, mas coisas vão sair. Vamos fazer o possível esse ano, temos pensado em parceria, álbum. Vamos fazer um retiro entre nós, ouvindo coisas que gravamos sozinhos e juntos e analisar tudo. 

Gustavo: Dá para sentir a galera da banda meio que com fome disso, mais do que nunca, para esse próximo retiro. Vontade de se juntar cada vez mais para fazer música.

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