Pluma: “A experimentação faz parte do processo”

foto por maria caulevy

Para criar um som como o que Pluma faz, é preciso juntar atributos muito específicos. Começa pelo conhecimento de possibilidades sonoras de uma banda formada na faculdade de Produção Fonográfica. A curiosidade permite que o vocal doce e uma base psicodélica conduzam um desfile de estilos como jazz, neo soul, pop, indie rock, música brasileira e mais. A inventividade faz com que os ritmos e acordes se desenrolem de formas surpreendentes. E o entrosamento garante que tudo saia com personalidade.

Se o critério for participação em festivais, deu muito certo. A força dos EPS Mais do Que Eu Sei Falar (2020) e Revisitar (2021) levou o grupo ao Primavera Sound de Barcelona, na Espanha. Agora, com o primeiro álbum lançado, Não Leve a Mal (2024), Pluma se prepara para tocar na próxima sexta-feira (28) no Lollapalooza Brasil, no Autódromo de Interlagos, em São Paulo.

Em meios aos ensaios para o show, Marina Reis (vocal), Diego Vargas (teclado/synth), Lucas Teixeira (bateria) e Guilherme Cunha (baixo) pararam pra falar com o Música Pavê na Casa Rockambole. O entrosamento se mostra quando os quatro completam os raciocínios uns dos outros, e uma outra característica aparece: A juventude de quem tem convicção do que está fazendo, mas precisa processar tudo que viveu num tempo muito curto.

Música Pavê: Eu queria começar falando desse processo dos ensaios, como têm sido esses dias pra vocês?

Marina: Nós estamos ensaiando todos os dias praticamente. Já faz um tempo que a gente tá superfocado no show do Lolla, e essa semana a gente começou a ensaiar no teatro.

Diego: Estávamos só no estúdio passando as músicas. Nós botamos tudo pra trás, começamos a montar o show do zero de novo, mudamos umas paradas em algumas músicas. Agora, estamos testando para ver como é que sai no PA, porque no estúdio a gente ensaia tudo de fone, é meio difícil ter noção do som que vai sair exatamente.

MP: Podem adiantar alguma coisa do Lollapalooza?

Marina: A gente reinterpretou algumas músicas, mudamos um pouco o arranjo, tentamos nos reconectar com tudo. Porque a gente gravou, querendo ou não, faz dois anos, talvez até mais. Tem um processo de amadurecimento pessoal da banda…

Diego: …e das próprias músicas.

Marina: …e das próprias músicas. Então tem algumas mudanças de arranjo que a gente sente que ficou muito legal, dá até vontade de regravar do jeito que a gente tá tocando agora. Vai ter uma participação também, do Pedro Martins (O Grilo).

Guilherme: É um show novo, são as músicas que a gente já tocava, mas de uma forma diferente. Tem algumas novidades, algumas coisas a mais, alguns detalhes que a gente prestou mais atenção.

MP: Qual a diferença para vocês entre tocar num lugar fechado, um show mais voltado pra vocês, e em um festival? Tem diferença?

Marina: Ah, acho que tem bastante. Começamos tocando já em alguns festivais, então sentimos muito isso. Algumas pessoas vão pra te ver, mas, principalmente quando você é uma banda que tá no começo, tem uma grande parte do público que não sabe quem você é. Tem essa sensação de fazer um show pra conquistar, pra convencer quem tá lá passando. São shows mais curtos também, então dá vontade de colocar tudo que você tem naqueles 45 minutos. Acho que não dá pra depender tanto da plateia.

Guilherme: É um pouco mais frio, né?

Diego: As luzes fazem muita diferença. Porque no festival a gente sempre tá tocando de dia, né? Um festival de noite talvez seja diferente. Mas o nosso show é muito sobre o visual, também.

Lucas: Sinestésico.

Diego: A gente gosta de deixar poucas luzes, fazer bastante contraluz.

Marina: Estar num lugar menor, onde o público já conhece, canta junto, é outra experiência. Você sente que o público tá fazendo uma grande parte do show. Essa troca gera uma energia que rola organicamente. No festival é um pouco mais uma apresentação, onde você tem que contar só com você mesmo.

MP: E como é transportar a gravação pro show? Porque as músicas de vocês são complexas, tem muita coisa de produção. Tem uma dificuldade?

Diego: Muitas das músicas, a gente muda. Porque aquele arranjo, aquela velocidade que a gente gravou funciona no álbum, no meio das outras. Quando você tá escutando todas, faz sentido, com a música um pouco mais baixa ou mais lenta. Quando a gente leva pro show, tem que acelerar, tem que botar um arranjo mais elaborado, pra animar a galera que tá lá.

MP: Na hora de fazer as músicas e os arranjos pra shows, como é que vocês fazem pra harmonizar todas as influências?

Diego: A gente não se controla muito, não. A gente bota tudo num caldeirão.

Lucas: Às vezes harmoniza, às vezes não harmoniza (risos).

Diego: A gente vai botando tudo. Quando a gente tá fazendo música, vai botando, botando, aí ela fica lotada de coisas. Depois a gente vai… “Precisa mesmo isso daqui?” Se a música tem todas as coisas o tempo inteiro, não tem dinâmica. Então, a gente tira algumas partes.

Guilherme: Nesse álbum, rolou vários momentos. Às vezes, a música estava meio caótica ou no meio da construção dela. “Pega uma ref de voz de tal música”, “pega uma ref de timbre de teclado de uma música que não tem nada a ver com aquilo”, aí uma ref de groove que também não tem nada a ver.

Lucas: Eu acho que as nossas limitações também vão moldando a personalidade da banda. Então, a gente quer fazer um house, mas a gente não é DJ e nem passou tanto tempo ouvindo house e as influências desse gênero. E a gente faz do nosso jeito, com as nossas limitações. Drum’n’bass é a mesma coisa.

Guilherme: E nem fica um drum’n’bass real. Rolou e talvez seja outra coisa, ou não, mas é isso.

Marina: A gente não tem medo de ir puxando. E às vezes não dá certo e tudo bem.

Diego: É, a maioria das vezes não dá certo (risos).

Marina: É, quando não dá certo, não dá certo, mas também correr esse risco é correr o risco de fazer uma coisa diferente e que pode ser muito legal. Eu sinto que isso sempre foi uma motivação grande pra gente. Tentar chegar num resultado que a gente veja alguma coisa diferente, meio nova e surpreendente.

MP: Dá pra fazer um balanço de como foi todo o processo do disco, desde a gravação, o lançamento, até agora?

Diego: Nossa, foram muitos momentos (risos).

Lucas: Metamorfoses constantes.

Guilherme: Acho que pode começar pelo mês de lançamento. Ao mesmo tempo que é um alívio de ter saído o álbum, uma ansiedade que acaba, começa um outro tipo de ansiedade, da gente ver quem estava ouvindo, se estavam curtindo e quais eram as nossas expectativas. A partir do momento que foi para o mundo, a gente estava alinhando o que a gente tinha pensado com o que estava acontecendo de verdade. Também os shows de pós-lançamento, já tinha algumas músicas que a gente tocava antes de lançar o álbum, mas aí de fato fazer os primeiros shows, as primeiras vezes que cantaram ao vivo junto com a gente…

MP: Tu lembras especificamente dessa situação do pessoal cantando?

Guilherme: Ah, eu lembro, acho que o primeiro show foi 5 Bandas, não foi?

Marina: Foi, aqui, inclusive.

Diego: Foi muito foda esse show.

Guilherme: Algumas músicas que você não esperava que a galera ia cantar, tava rolando já, sabe?

Marina: Quando começou o show já tinha muita gente cantando.

Guilherme: Foi uma novidade ali, foi um momento. Teve os shows de abertura com Crumb também, que foi uma mistura de algumas pessoas que já conheciam a gente com…

Diego: Uma grande maioria que tava pra ver Crumb.

Guilherme: Exato, e não conhecia a gente, e aí aquela pessoa que nunca ouviu falar na banda, vendo aquilo e curtindo, ou não, enfim, mas…

Diego: (Risos) Ou não.

Guilherme: É, não sei se todo mundo curtiu, mas a gente teve muito…

Lucas: (Risos) Não, com certeza, todo mundo não curtiu.

Guilherme: Teve uma resposta boa de uma galera que nunca tinha ouvido. A gente foi pro Rio de Janeiro, foi pra Porto Alegre também. A gente tocou lá no Opinião.

Marina: Foi muito legal. Público muito receptivo.

Guilherme: Lá foi um dos mais legais. Foi um pouco diferente, não sei se era o dia específico…

Marina: Eu senti que era uma coisa do lugar, o pessoal muito receptivo. Muito aberto.

MP: O som de vocês é bastante contemporâneo. Como vocês se veem no cenário da música brasileira e mundial?

Marina: Bom, acho que mundial é difícil (risos). Mas, brasileira…

Diego: Mundial, a gente é tipo um atomozinho… (risos)

MP: Mas na questão do estilo.

Marina: É, eu acho que a gente puxa muito de muitos lugares, e isso é uma característica nossa. Desde o começo, teve essa vontade orgânica de puxar de gêneros diferentes e não necessariamente se encaixar em um caminho. E eu imagino que isso é uma coisa que a gente vai sempre continuar fazendo. A gente escuta também um pouco de tudo, pop, R&B, hip-hop, neo-soul, muita música brasileira, óbvio, a gente tá fazendo música brasileira.

Guilherme: A gente tem essa vontade de fazer coisas novas também. A gente sempre tenta se desafiar.

Marina: Se surpreender com as nossas próprias músicas.

Guilherme: É, a mistura disso com o que Marina falou, de ouvir um monte de coisa, e cada um da banda ser parecido e muito diferente ao mesmo tempo, dá esse resultado.

Marina: E na cena alternativa brasileira hoje em dia, eu vejo que tem vários artistas que não necessariamente se encaixam num gênero só. E é tudo música brasileira, alternativa, indie. Acho que essa experimentação faz parte do processo.

MP: O Brasil está preparado para uma banda sem guitarra?

Marina: Eu acho que, das coisas que Pluma faz, talvez não ter guitarra seja…

Guilherme: Seja a mais de boa (risos).

Marina: …a mais de boa. Não sei, eu fico pensando…

Lucas: Na marcha contra a guitarra elétrica dos anos 60? (risos)

Guilherme: Tem vários artistas que são referências pra gente, que a guitarra ali não está como um elemento principal. Eu entendo que na banda, quando os quatro integrantes têm um peso individual, é um pouco diferente, mas eu concordo com o que a Marina fala, não ter a guitarra até que é tranquilo. Tipo, Amy Winehouse tem vários arranjos, shows ao vivo mesmo que a harmonia tá pautada ali no teclado, no piano, no synth.

Lucas: No Brasil, a maioria das ondas de rock que vieram da gringa eram muito baseadas em guitarra. Desde os anos 70, a new wave dos anos 80, o emocore. Talvez, vai, Los Hermanos seja a exceção dessa regra…

Diego: E que tem duas guitarras.

Lucas: Tem guitarra, mas o principal não é a guitarra. O que dá o peso é mais a canção. Então talvez Pluma esteja descobrindo novos caminhos, possíveis ou não, desse lugar meio estranho, que é o indie brasileiro.

Diego: Sem guitarra.

Lucas: Sem guitarra.

MP: E o que vocês querem ver no Lollapalooza?

Marina: Bom, segunda-feira eu tinha falado Fontaines D.C., mas não vai ser mais possível, infelizmente. Se a gente conseguir, nos outros dias, eu quero muito ver Parcels. Acho que todo mundo quer ver Parcels, The Marías.

Diego: Com certeza, Parcels e The Marías é o plano pra gente.

Guilherme: Quando eu vi o line-up a primeira vez, eu vi esses nomes, foram os que eu foquei.

Diego: Aquela dupla de rap argentino…

Guilherme: Ca7riel y Paco Amoroso. Esse também, o show deve ser uma loucura.

Marina: Sexta eu tô animada pra ver Olivia Rodrigo…

Todos mais ou menos ao mesmo tempo: Justin Timberlake.

Guilherme: Deve ser um showzasso.

Marina: Qualquer show de pop, deve ser showzão.

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