“Cartilagem”: Alexandre Kumpinski É “Híbrido e Paradoxal” em Primeiro Disco Solo

foto por afrovulto

“A beleza no ruído é algo muito intuitivo para mim”, conta Alexandre Kumpisnki ao refletir sobre a estética de seu primeiro disco solo, Cartilagem, lançado no fim de 2022. Em entrevista ao Música Pavê, ele explica que sua música flui com naturalidade entre um formato tradicional de canção e experimentos com sonoridades e até mesmo objetos diversos, como fez com Apanhador Só.

“Gosto de buscar um equilíbrio entre esses dois caminhos, porque acho que a canção redonda, pop, ela consegue comunicar, o que eu acho importante”, conta ele, “ao mesmo tempo, o experimentalismo abre brechas e complexifica um pouco a realidade que a gente está vivendo. Então, [busco] o equilíbrio entre essas coisas, uma música que consiga comunicar e emocionar – comunicar através de ideias filosóficas, mas que serão melhor concebidas se trazidas emocionalmente com algum tempero estético de provocação, que acione a inteligência. Tento um equilíbrio entre todas essas coisas. Nem sempre sou bem sucedido, mas esse é meu norte”.

Cartilagem dá início ao projeto solo de Kumpinski, ao mesmo tempo que dá continuidade a essa sua busca artística. “É um recomeço, um novo capítulo, um começar do zero sem ser do zero, tudo isso misturado”.”, explica ele, “é tudo híbrido e um pouco paradoxal”. Assim como com Apanhador Só, o músico montou o disco a partir de composições que ele fez durante um período específico – no caso, o fatídico ano de 2018 no Brasil.

“Eu estava vivendo uma urgência de falar sobre a tendência fascistóide generalizada que estávamos vivendo enquanto sociedade brasileira”, conta o artista, “e quando digo generalizada é porque é por todos os espectros políticos. Lembro de pensar que a extrema direita estava começando a mostrar os dentes com um comportamento bastante temperado de fascismo, e a esquerda acompanhava isso com as mesmas estratégias e ferramentas, causando o mesmo tipo de cegueira e de moralismo. A coluna vertebral filosófica do disco começa a partir da percepção disso”.

Não à toa, o álbum inicia com As Pontes e os versos “as pontes estão queimadas, as portas estão fechadas”. Como Kumpinski explica, “a vontade era de dizer que temos que construir pontes, não levantar muros. Essa era a tendência generalizada nas redes sociais, de ficar apontando o dedo na cara dos outros, dizer que os outros são monstros, são isso ou aquilo. A minha bolha nas redes é de esquerda e eu via muito isso, de querer apontar o dedo na cara dos outros e lacrar. E ‘ninguém presta’, parece que todo mundo que está ali é um bastião da pureza e da verdade. E isso alimenta também o outro lado. É uma tendência que, infelizmente, segue até hoje. Os quadros políticos estão mudados, mas os humores internos, o funcionamento psíquico, seguem na mesma receita. Por isso o disco, feliz e infelizmente, não envelheceu tanto”.

O intervalo entre a composição e o lançamento do disco é explicado – para a surpresa de ninguém – pela pandemia do covid-19. Seus planos eram lançá-lo no início de 2020, como Alexandre disse ao Música Pavê na época, mas Cartilagem foi “para a gaveta” por cerca de dois anos, enquanto o músico trocou a residência em Porto Alegre por uma Kombi, com a qual viajou o país com sua companheira, Lúcia Tietboehl.

Ao retornar à cidade em setembro de 2022, ele decidiu finalizar o álbum e colocá-lo no mundo, coincidentemente em mais um ano eleitoral, que evidenciou a relevância das faixas. “f”Fiquei muito tempo sem ouvir o disco durante a viagem”, conta o músico, “mas, quando escutei de novo, tive esse susto positivo, de ver que ele ainda está super atual. Curiosamente, as músicas encontraram uma nova angulação que fizeram com que elas fizessem ainda mais sentido”. Fiquei muito feliz com isso”.

Prestes a ser pai pela primeira vez, Alexandre Kumpinski fará uma pausa na divulgação de Cartilagem para cuidar da bebê e se ajustar a essa realidade híbrida e paradoxal, bela e ruidosa, na qual ela nascerá – o que, invariavelmente, deve influenciar também suas próximas composições. “Acho que o ruído faz parte da vida’, conta ele, “é preciso incorporá-lo na beleza da música, porque é algo que amplia seu escopo e suas possibilidades”.

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