“Na Espera da Fila”: Vitreaux Comunica o Brasil Pós-2016 em Álbum
O ano é 2016: Onde você estava, o que você pensava e o que te dava medo? O quarteto Vitreaux sabe responder essas perguntas com facilidade, já que seu mais recente álbum, Na Espera da Fila foi todo composto (e inspirado) naquele ano – que será, muito provavelmente, lembrado pela história como um ponto de virada importante na história brasileira.
“Foi quando tudo começou a romper”, relembra o vocalista e guitarrista Lucas Gonçalves, “estava rolando um golpe que já vinha sendo arquitetado há um tempo e a gente pensava o que seria do futuro. Já parecia uma distopia, tudo tinha uma névoa, tudo era triste”. Com três integrantes morando na mesma casa (Lucas, o baixista João Rocchetti e o guitarrista Ivan Liberato), eles começaram a compor sobre como percebiam essas questões em seu íntimo.
Isso deu a Na Espera da Fila um aspecto de vontade de alçar vôo, mas não conseguir sair de poucos metros do chão – o que os arranjos comunicam bem. Ivan explica que as músicas são sobre “você querer sair desse sistema que te machuca, que está doendo. Mas a gente vive uma coisa tão controlada há tantos anos já, não sei se existe esperança. A gente decola, mas sempre volta pra terra”.
É uma sensação que pode ser percebida ao longo de diversos momentos da obra. “Em Fim da Greve, quando se retoma o tema inicial, a música parece que vai decolar, só que daí vem aquela marcha, como se fosse uma banda militar, e aterra a música de novo”, comenta João, “não é um álbum rock’n’roll, 4×4, upbeat. A maioria das músicas é 3×4, ele é lento e melancólico”.
Em meio a esse clima pesado, há um subtexto interessante que nasce na maneira como os arranjos são percebidos pelo ouvinte. Diferente de discos de canções nas quais os instrumentos apenas dão apoio ao vocal, Na Espera da Fila se mostra como uma obra bastante coletiva, para além de seu processo conjunto de composição.
“Ele é todo muito coeso”, conta João, “as guitarras estão juntinhas, e o baixo está com a bateria”. Lucas relembra que até a mixagem teve bastante participação dos músicos: “Um falava ‘tá massa isso aqui’, o outro falava ‘não, põe mais um pouquinho’ (risos), tinha que chegar a um consenso, é democracia”.
Vendo isso, Ivan reflete sobre como o processo do disco nasceu da vontade de “horizontalizar as questões sociais. De alguma forma, isso nos guiou mesmo sem percebermos. Estávamos tão fissurados em uma ideia de justiça, tão apegados e sofrendo por isso, e essa ideia reverberou no disco. É uma banda fazendo algo junto sem ter um grande protagonismo de alguém, sem ter um foco absoluto em uma pessoa só”. Por isso, seu lançamento em pleno 2020 pandêmico, com golpe atrás de golpe, nos relembra que é em coletivo que se vive, se lamenta e, contudo, também se sonha.
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