Entrevista: Manoel Cordeiro

foto por josé de holanda

Guitar Hero Brasil: Há um senso de humor natural no título que Manoel Cordeiro escolheu para seu mais recente álbum. Tendo em vista as tantas décadas de trabalho como produtor, compositor e instrumentista – em trabalhos que somam quase mil contribuições em discos de outros artistas -, o respeito que seu nome carrega torna o título do disco incontestável.

Às vésperas do show de lançamento do álbum em São Paulo, o músico paraense falou ao Música Pavê por telefone sobre algumas das escolhas que fez para a obra, e sobre sua (ótima) relação com a música brasileira de hoje.

Música Pavê: Manoel, quantos Brasil estão presentes no disco?

Manoel Cordeiro: (Risos) Olha, cara, que pergunta linda. Tem vários Brasis sim, que é como é o nosso Brasil. Tem o do norte, o da Amazônia, o do Amapá, o do Pará… Eles estão tão perto e são tão diferentes do ponto de vista cultural. O Amapá é mais afro, Belém é mais europeia no meio da Amazônia. O disco tem essa viagem, do som afro, o som meio cabo-verdiano e as relações com os parceiros do Rio e São Paulo. Esse disco me deixa feliz por causa disso, ele me permite estar nesses Brasis como é o Brasil. Eu tô feliz com o disco, subo no palco pra tocá-lo com muita felicidade.

MP: Não me parece arriscado dizer que a pluralidade na obra é bastante intencional. Como foram as escolhas estéticas para o álbum?

Manoel: É, eu quis passar o meu sentimento mesmo. Quando fui gravar em Macapá, quis sentir aquela aura, a da foz do Amazonas. Não queria que soasse um grave qualquer, mas um grave de batuque de um tambor de lá. A parte de Belém, onde criamos a lambada, gravei o brega, o carimbó, aquela coisa bem ribeirinha. A viagem foi essa, a de fazer uma música popular brasileira que fosse da Amazônia.

MP: Como é para o senhor se comunicar – contar histórias mesmo – através da música instrumental?

Manoel: É um trabalho de melodia e ritmo. Esse disco tem um batuque, aquele mais visceral africano. Ele fecha com Olhando dos Andes, que é sobre alguém em cima da cordilheira com a pura sensibilidade de ter visto a Amazônia de cima e ter sonhado como ela como uma referência de vida para o mundo. O disco tem essas nuances diferentes. Você pode dançar se quiser, ou só prestar atenção na viagem sonora. As camas harmônicas guiam essa percepção. Quero desnudar minha alma, meu sentimento pela alegria de contar histórias. É meu segundo disco solo de quase mil que já fiz para os outros. Nesse, eu quis contar desde o começo da inha vida em Macapá, onde comecei a tocar aos 12 anos, até a minha vivência no Sudeste agora, depois de ter passado por Belém.

MP: No meio disso, como foi a decisão de também ter Mel de Melaço, uma canção propriamente dita, no meio do repertório.

Manoel: Essa faixa tem uma história. Eu fiz essa há mais de 40 anos, e tanto escrevê-la quanto gravá-la para o disco aconteceram sem nenhum escorço. Foi como se eu ainda lembrasse dela no momento em que a fiz, quando até achava que não era minha (risos). Eu fui fazer uma viagem a Bragança no Pará, passei por cima de uma ponte e voaram as guarás, aquelas garças vermelhas. Eu gravei em um gravadorzinho o que me veio na cabeça naquela hora. Foi tão natural que eu achei que estava gravando uma música que já conhecia. Fui até perguntar ao meu pai de quem era aquela música (risos). E chamei agora as vozes mais bonitas que conheço (Patrícia Bastos e Zé Renato) para o disco. Fiquei muito feliz com essa faixa, esse conteúdo místico que ela tem. O dia que eu achar o dono dessa composição, eu devolvo (risos). Fiz sem nenhum esforço, deve ter sido algum movimento da natureza e de Deus.

MP: O senhor trabalha bastante com seu filho Felipe Cordeiro, e participou recentemente de trabalhos de Otto, Jaloo e Marcelle. Como é estar em contato frequente com novas gerações e outros estilos musicais diferentes do seu?

Manoel: Em 2010, eu tinha quase decidido parar de tocar, eu estava querendo pegar peixe em Macapá (risos) e o Felipe me falou para ajudá-lo em um disco. Desde esse trabalho, o Felipe acaba sempre me mostrando músicas novas que acontecem pelo mundo, do leste europeu a Buenos Aires. Essa é a coisa mais linda do mundo, sou nuito interessado em contemporaneidade. Esse pessoal, a Marcelle, o Jaloo, eles gostam muito de música mesmo, da linguagem musical. Isso é um diferencial dos jovens de hoje.

MP: Para terminar, conta pra gente como foi a escolha do título do disco?

Manoel: (Risos) Quem é Guitar Hero do Brasil? Eu acho que tocar guitarra aqui é um gesto heroico. Para o Mestre Vieira, pai da guitarrada, as coisas eram muito difíceis. Hoje ainda é, imagina há 50 ou 60 anos como era chegar um amplificador ou um teclado no Norte. Então, ele fazia o ampli dele. Tocar guitarra é um ato heroico. Não é no sentido ostensivo não, é uma homenagem aos grandes mestres. A guitarra é um instrumento vibrante, que possibilita a gente a fazer muitas coisas. Tentar fazer da sua vida através da guitarra é um gesto heroico. 

Lançamento Guitar Hero Brasil | Manoel Cordeiro

Z | Av. Brigadeiro Faria Lima, 724 (Largo do Batata) – Pinheiros – São Paulo
Horário | 22h abertura da casa | 23h Zek Picoteiro (PA) | 00h Manoel Cordeiro | 1h30 Pardieiro DJ Set
Convidados | Kassin e Luiz Chagas
Ingressos | antecipados R$ 20,00 | na hora: R$ 30,00
Capacidade | 250 pessoas
Contato | (11) 2936-0934

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