Entrevista: 5 a Seco

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(Curta mais da série 2014 Define no Música Pavê)

5 a Seco está longe de ser uma mera banda, não importa por qual ótica você faça a análise. Já sabíamos disso antes do lançamento de Policromo, seu segundo álbum (e, curiosamente, o primeiro de estúdio), e tudo ficou ainda mais evidente com seu lançamento, já que ele traz novas nuances em lírica, arranjos e timbres do que já conhecíamos do grupo.

E nenhuma outra palavra poderia definir melhor 5 a Seco como “conjunto”, já que é formado por cinco músicos (Vinicius Calderoni, Tó Brandileone, Leo Bianchini, Pedro Viáfora e Pedro Altério) conhecidos também por seus trabalhos solo. A reunião de talentos e vozes rendeu mais um trabalho surpreendente e perfeitamente alinhado com nossa época – e o que eu gosto cada vez mais de chamar de Pós-MPB -, lançado pelo sempre atento Natura Musical.

Na hora de votar nos dez nomes que definiram 2014, a maioria da equipe do Música Pavê mencionou o quinteto. Para marcar a estreia do especial, batemos um papo com Pedro Viáfora por email sobre o novo disco, shows e este momento da música brasileira.

Música Pavê: Como foi realizada a curadoria do repertório do disco? Como vocês conseguem aliar a união do grupo nessa escolha?

Pedro Viáfora, 5 a Seco:   Foi um processo completamente diferente para todo mundo do 5 a seco. Isso porque, pela primeira vez, nós nos deparamos com a “obrigação” de compor. Quando recebemos a notícia de que havíamos sido contemplados no edital do Natura, em novembro de 2013, nós tínhamos apenas três músicas que pensávamos em usar no disco e um prazo de 3 meses até o início das gravações na Gargolândia. Sempre houve em nós um desejo de que o disco novo do 5 a seco fosse um disco de músicas inéditas. Como no intervalo entre o Ao Vivo no Auditorio Ibirapuera e o Policromo todos nós havíamos gravado disco solo, sobraram poucas músicas inéditas. Fizemos um cálculo que, contando com as parcerias internas, cada um teria de 4 a 5 músicas de sua autoria no álbum. Acabou que o Policromo foi um disco de músicas compostas para o Policromo. Onze das catorze músicas foram compostas durante o processo de pré-produção do disco. A cada ensaio, alguém chegava com alguma ideia nova que, sendo assimilada pelo grupo, ganhava grandes chances de entrar no repertório. Foi um período tenso, pelo receio de não conseguir garantir as músicas no prazo, e prazeroso, por ver o trabalho que surgiu do nada ganhando forma. A união do grupo foi muito forte porque todos nós, inclusive os autores das canções, estávamos ali conhecendo as músicas, o que tornou o trabalho ainda mais coletivo.

MP: Policromo traz uma atmosfera consideravelmente diferente em relação aos seus trabalhos anteriores. Como foram as escolhas dos timbres que estão no álbum?

Pedro: A união dos produtores, Tó Brandileone e Alê Siqueira, foi vital para a construção timbrística do disco. Muitas das ideias já surgiram no processo de pré-producão, na casa do Tó. Atribuo essa diferença na atmosfera sonora principalmente a ele e suas pesquisas com as guitarras e os diversos pedais de efeito que acabaram formando a linha que conecta as músicas do disco. O Tó sempre foi um cara que se liga muito em pedais e timbres de guitarra. Quando chegou o Alê Siqueira, com todo o seu conhecimento e experiência, não havia como dar errado. Cada timbre foi pensado e repensado para ficar do jeito que queríamos.

MP: Como vocês lidam com os rótulos colocados em suas músicas? Algum deles já chegou a surpreender ou mesmo incomodar?

Pedro: Acredito que a música é nossa até o momento em que a gravamos e liberamos para o mundo. A mesma música desperta sentimentos e sensações diferentes nas pessoas, e os autores não tem o controle disso. Já vi pessoas interpretando minhas canções de uma maneira completamente diferente daquilo que eu quis dizer, e se emocionando com isso (risos). Acho super bacana esse poder que a música tem de causar emoções nos outros. Por isso, não me sinto incomodado de jeito nenhum.

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MP: Vocês se veem inseridos em uma “cena” no Brasil? E como vocês percebem o momento da música brasileira do qual vocês fazem parte?

Pedro: É um momento diferente. Vivemos uma época em que nunca se escutou tanta música no mundo e, ao mesmo tempo, o ofício nunca foi tão desvalorizado. A Internet rompe com a exclusão da mídia, expande o universo musical, mas não viabiliza financeiramente o oficio do compositor. Isso é, mais pessoas escutam nossas músicas, mas menos gente paga por isso. Vivemos um período de mudanças efêmeras e ainda não sabemos onde isso vai parar. O dinheiro que se gasta para gravar um disco é altíssimo e o retorno é cada vez menor, porque as pessoas estão deixando de comprar CDs (até porque hoje os carros e computadores novos já nem vem mais com leitores de disco) e se associando aos sites de streaming, em que paga-se uma mensalidade fixa, tem-se um acesso ilimitado às canções de todo mundo, mas o repasse para os autores é baixíssimo. Ou seja, o autor está deixando de ter poder sobre o seu maior produto que são suas canções. Isso acaba tendo um impacto grande na produção musical como um todo. Vejo artistas talentosíssimos debandando para outras áreas por não acreditar mais na música como profissão. Se fosse pra me ver inserido em alguma “cena”, eu diria que me vejo inserido nessa cena dos músicos que ainda acreditam que podem viver da música e viabilizar a carreira, independente do gênero musical que faz. Acho que a música tem o poder de unir todo mundo, todas as cenas.

MP: Daqui do outro lado, fica a impressão que 5 a Seco é um “dream team” de compositores e intérpretes. Como um acaba influenciando (acrescentando ou mesmo alterando) a composição do outro na produção do disco, ou ao vivo?

Pedro: A influência mútua entre os integrantes do 5 a seco é o grande trunfo do projeto. Acho que, além de sermos todos muito amigos, existe uma admiração musical muito saudável para a produção. Sempre que alguém faz uma música nova e vai mostrar para o grupo, existe uma certa tensão para saber a opinião dos outros. Porque a opinião dos outros realmente conta. A influência que um exerce sobre o outro na hora de compor já é inconsciente, mas muito presente.

MP: Sobre shows, o quanto vocês aprendem ao levar as músicas para o palco? Como foi o processo de dar a Policromo esse formato?

Pedro: Aprende-se muito. E daí voltamos à raiz do projeto: o conceito desde sempre foi o de não haver músicos acompanhantes no palco (por isso o nome “a seco”). Teríamos que nos bastar e, para isso, precisávamos começar a nos arriscar em outros instrumentos que não eram o nosso violão (todos são essencialmente violonistas). No começo do projeto, o show tinha basicamente violão e guitarra, e eram poucas as músicas em que os 5 estavam presentes o tempo inteiro no palco. Com o passar do tempo, o show foi pedindo os outros instrumentos (baixo, bateria, teclado etc). Hoje todos ficam o show inteiro no palco, tocando e se revezando em instrumentos cuja técnica é completamente diferente da do violão. Não tenho dúvidas em afirmar que 5 a seco foi (e ainda é) a maior escola para todos que estão ali. Com o Policromo, foi um processo diferente, porque tínhamos que levar o disco para o palco (diferente do Ao vico no Auditório Ibirapuera, onde levamos o palco para o disco). Então, inicialmente, para o show, fomos dividindo os instrumentos música a música e tínhamos o disco como um modelo ideal para nos guiar sonoramente. Não precisamos criar arranjos, mas foi necessário adaptar diversas coisas do disco que são impossíveis de reproduzir no palco. Para isso contamos com o apoio da tecnologia: loops a serem disparados do iPad, os timbres do disco processados no computador e disparados de um controlador MID, etc.

MP: Outra impressão que temos é de uma grande diversidade no público da banda – tem desde quem se apaixonou por uma letra romântica até quem se interessa pelos arranjos e composição. Como vocês enxergam o ouvinte do grupo?

Pedro: Também não consigo determinar como é exatamente o perfil do público do 5 a seco. Acho que, pelo fato de todos sermos compositores, as canções não seguem um padrão que caracterize os ouvintes. Há muitas músicas do repertório do 5 a seco que são parcerias com outros artistas, que tem outro perfil. Acho que é justamente essa diversidade de compositores que caracteriza a diversidade do público.

MP: Pra acabar, como vocês gostariam que Policromo fosse lembrado daqui dez anos?

Pedro: Daqui a dez anos gostaria que o policromo fosse lembrado como o segundo disco dos seis que o 5 a seco já lançou (risos).

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