Coletânea: Garbage

Do começo dos anos 90 até hoje, muita coisa mudou no jeito de produzir, vender e ouvir música, não só por motivos óbvios como a tecnologia, os formatos e canais, mas principalmente porque a gente já não a consome da mesma maneira. Nem é preciso entrar em detalhes, o fato é que, dessa máquina industrial veloz, acaba surgindo um produto quase descartável, feito de artistas presos há um único álbum e de fãs repedindo hits num looping sem fim. Acontece que, em 2012, vimos uma avalanche de grandes bandas ressurgirem após longos períodos de hiato, mas, uma delas, na nossa opinião, foi a mais marcante.

O quarteto norte americano Garbage, formado por Duke Erikson, Shirley Manson, Steve Marker e Butch Vig, emplaca hits em rádios, canais de TV e grandes festivais desde a época das antigas e unânimes prateleiras das lojas de CD. Porém, com o recém lançado Not Your Kind of People, a banda trouxe um álbum sólido e conectado ao seu tempo, não por experimentações tecnológicas bizarras, mas por manter seus valores, sua atmosfera sonora e sua linguagem durante quase 20 anos – além de, finalmente, ter vindo ao Brasil. Para ilustrar essa trajetória, selecionamos alguns clipes que irão contar, ao nosso modo, o retorno mais foda de 2012.

Stupid Girl (1995)

Depois dos singles lançados para Vow, Queer e Only Happy When It Rains, Stupid Girl chegava para completar o estouro do primeiro disco de estúdio da banda, o homônimo Garbage, de 1995. Sem uma conexão direta com a letra e numa gravação também sem grandes produções, o clipe vai fundo na dramática iluminação, nos efeitos sujos de edição bem típicos dos anos 90, além da quase ausência de múltiplas cores nos quadros e dos longos planos em slow, tudo para imprimir um ar sombrio e ao mesmo tempo sexy, modelo que viria a acompanhar o grupo até o final da década.

I Think I’m Paranoid (1998)

Agressiva, afirmativa e rancorosa, I Think I’m Paranoid foi o segundo single lançado para Version 2.0, de 1998. O clipe seguia a fórmula do Garbage para criar sua atmosfera sombria e sedutora, mas era enriquecido com closes cheios de distorções, que expressavam o sentimento de loucura proposto pela letra. Aliás, esses efeitos especiais foram muito usados naquela época. Particularmente e sem medo, posso dizer que essa é uma daquelas músicas que trazem uma legião de fãs para uma banda. Eu sou um desses, com certeza.

The World Is Not Enough (1999)

Nesse período em questão, Garbage atingia seu auge. The World is Not Enough era a segunda música que a banda encarava para a trilha sonora de um grande filme – nesse caso, a milésima segunda estreia do agente 007 nos cinemas, em 1999. E o clipe ganhou uma super produção, com direito a um clone androide criado para substituir Shirley e, por fim, a carreira da banda em um desfecho explosivo. Os efeitos especiais, diga-se de passagem, são muito bem executados e os planos, longos e lentos dão toda dramaticidade ao enredo. A música entrou pra edição japonesa de Beautiful Garbage, lançada em 2001.

Shut Your Mouth (2001)

Para a divulgação do quarto e último single de Beautiful Garbage, a banda encomendou uma animação 2D dirigida por Henry Moore Selder, que na época já havia trabalhado com a estreia do The Hives para o vídeo de “Hate to say, I told you so”, feito que teria impressionado a própria Shirley, garantindo assim o convite. O roteiro trata de uma punhalada na imprensa sensacionalista, representando a vocalista em uma sessão invasiva de perguntas de um talk show qualquer, desses bem característicos que a gente vê depois das onze da noite. A animação mistura essas cenas com ilustrações da banda em um outro formato. Destaque para os rostos das pessoas na plateia, como se todos fossem uns quadrados, gente vazia afoita por baixaria e pela vida alheia.

Run Baby Run (2005)

Assim como qualquer outro clipe do Garbage gravado após o início dos anos 2000, as grandes produções e as tomadas externas dão o tom de uma safra mais madura musical e comercial da banda. Porém, talvez refletindo sobre onde a banda chegou, Run Baby Run traz um tema muito peculiar das grandes estrelas: o escapismo à fama e a busca pelo anonimato. Como parte da história, Shirley tenta se virar pelas ruas como uma mulher normal, em toda sua ansiedade e vontade de sumir numa multidão que não a note. Não existe a pose de rockstar, muito pelo contrário, mas a solidão ainda que necessária, parece não fazer sentido com tantos takes em telefones públicos.

Big Bright World (2012)

Sete anos depois de Bleed Like Me, Garbage retorna com Not Your Kind of People, resgatando a linguagem “sombria” que impregnava o início da banda. A diferença fica por conta da compilação homogênea de todos os estilos visuais da videografia do grupo, misturando a iluminação saturada e os tons de cinza a cenas captadas fora dos estúdios e o uso sutil da cor, de maneira mais lírica, emprestando, no caso de Big Bright World, uma certa dose de felicidade que quase não se cabe no tema fúnebre que o roteiro prevê.

Na curva do Garbage, três coisas ficam absurdamente claras: a banda continua fiel a sua linguagem, porém experimenta outros recursos que interpretam sua filosofia, ainda que sem perder a chance de polir seu discurso, quase como na analogia de uma pessoa adulta que compreende seu papel no mundo e sabe quais qualidades pode e deve ressaltar para se mostrar ainda absurdamente jovem e relevante.

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