Música Pra Quê?

Se pegássemos todo o material produzido nesses dois anos de existência do Música Pavê, talvez teríamos o que poderia vir a ser uma resposta (ou argumentos de uma) à pergunta que ninguém parece precisar fazer: Por que dar tanta atenção para a música?

Essa não é apenas uma das mais antigas formas de arte, mas é também uma das mais populares (isso se não for a mais), uma das únicas coisas que todas as sociedades do mundo tem em comum e que, no último século, se tornou também uma grande indústria – o que impulsionou a produção ao redor do globo em um volume que, para nossa felicidade, ninguém mais consegue dar conta de acompanhar completamente.

Como consequência disso, a música se faz cada vez mais presente nos mais diversos meios de veiculação. É trilha de filmes, programas de TV e propagandas comerciais, tem uma relação íntima e natural com o teatro, alimenta a vida noturna das pequenas cidades até às metrópoles e é usada até como uma forma de alerta, como nos toques de telefone ou nos megafones de carros e caminhões que oferecem algum tipo de serviço – isso sem contar seus usos mais nobres, como a musicoterapia.

Mesmo com tantas situações favoráveis a essa arte, sua popularidade absoluta se confirma ainda mais com o uso cotidiano e pessoal da música, que é quando alguém para o que estiver fazendo a fim de escutar alguma composição, ou mesmo prefere ouvi-la enquanto faz alguma outra coisa, como trabalhar, estudar ou qualquer outra atividade. Quem usa o transporte público deve ter reparado no número crescente dos fones de ouvidos entre a maioria dos passageiros nos últimos tempos – e quem anda de carro já ouve música enquanto se locomove há ainda mais tempo.

Mas esse uso tão frequente, por mais relevante que seja, não sustenta a resposta à nossa pergunta inicial. Não me parece o suficiente afirmar que música merece nossa atenção pelo simples número de pessoas que consomem música. E a questão talvez seja justamente essa, se aqueles que apertam o play estão de fato se dedicando a ouvi-la ou apenas escutando os sons ali apresentados.

Sempre que vejo as reações espontâneas de alguém ao realmente ouvir uma boa música e criar ali uma relação com ela (e esse é, de longe, um dos maiores prazeres do meu ofício), mais eu percebo a quantidade de pessoas que apenas escuta melodias e letras sem dar-lhes a devida atenção – e pena maior não há.

É claro que não tem como pedir que os ouvintes se identifiquem com todos os versos de boas canções que escutarem (ou mesmo com a maioria) e menos ainda exigir que as pessoas tenham repertório suficiente para avaliar as composições, mas falta uma certa pré-disposição à sensibilidade de desfrutar o que se ouve da melhor maneira possível.

E vem daí nossa vontade de ajudar os leitores a serem cada vez mais melhores ouvintes. Isso não significa necessariamente que as pessoas ouçam com maior frequência aquilo que julgamos como bom, mas que elas estejam mais dispostas a reagir aos sons que lhes são apresentados.

O processo de audição vem a ser tão complexo a ponto de extrapolar não só os sentimentos, mas também os sentidos – e por isso brincamos tanto com a visão. A boa música é tão carregada de atributos que faz-se necessário aprender mais e mais como enxergá-los.

Mas não são apenas os olhos que precisamos abrir ao ouvir música. Com eles, vem a mente com seu misto de repertório intelectual com a memória afetiva e a sensibilidade emocional que te faz ter empatia ou não com aquela composição. É a partir daí que começamos a nos relacionar de fato com uma canção e podemos vir a ser bons amigos dela.

Experimentar um pouco disso no dia-a-dia (sempre no aprendizado de melhorar minha audição) e não cutucar aqueles ao meu redor seria um desperdício imenso de grandes músicas que são produzidas diariamente e estão jogadas por aí no mundo para serem desfrutadas.

E é por isso que o Pavê continuará a juntar argumentos para responder o “por que dar tanta atenção para a música?”, ainda que ninguém se dê ao trabalho de nos questionar porque, intuitivamente, todos já temos a resposta – e o prazer que temos a cada play não nos deixa mentir.

(Ilustração de Antonio Peticov)

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