Em Cartaz: A Trilha Sonora Como Protagonista

Tim-Maia

O grande truque de mágica do cinema está em nos levar para mundos distantes – terra, céu, mar e espaço -, tudo isso sem derramar a pipoca pelo caminho. E se atores, fotografia, figurino, maquiagem e efeitos especiais estão aí para transformar essa jornada em experiência visual, a trilha sonora vem para embalar: acalmar, excitar, dar medo, fazer sorrir.

A boa notícia para os fãs da música nos filmes é que ela nunca perdeu seu destaque. A sofisticação da tecnologia de som está cada vez mais expandindo a qualidade e o impacto da trilha e de todos os efeitos sonoros para ajudar a contar uma história. Tanto que só no momento há pelo menos três filmes em cartaz nos cinemas brasileiros em que a música ganhou um dos papéis principais.

O primeiro deles é Tim Maia, cinebiografia de um dos maiores nomes da nossa música. O “Síndico” marcou também com sua personalidade forte, que voltou à tona com o lançamento de Vale Tudo, livro escrito por Nelson Motta. Ele é a base do filme de Mauro Lima, mas a história de Tim não teria o mesmo impacto sem a trilha ancorada nos seus principais sucessos.

Com Babu Santana e Robson Nunes encarnando o personagem título, o longa traz toda a potência da Banda Vitória Régia e passeia por alguns dos mais importantes momentos da carreira de Tim Maia, tanto ao vivo quanto no estúdio. Se o roteiro deixa algumas lacunas aqui e ali, a trilha chega com toda a grandiosidade daquele que é considerado o pai da soul music brasileira. Mas fique sabendo: é bem provável que você ouça durante a sessão alguém cantarolando os versos de Você, Festa de Santo Reis ou Imunização Racional. É inevitável.

Assim como é inevitável o burburinho por trás de dois dos principais lançamentos do ano. Um é Garota Exemplar, adaptação do best-seller de Gillian Flynn e dirigido por David Fincher (Clube da Luta, Seven). Não só o longa traz Fincher de volta a terreno conhecido – adaptações de obras literárias, dessa vez com a ajuda da própria autora no roteiro -, mas marca sua terceira colaboração com Trent Reznor (Nine Inch Nails) na trilha sonora original após Millennium: Os Homens que não Amavam as Mulheres e A Rede Social (pelo qual ganhou o Oscar). Mais uma vez trabalhando ao lado de Atticus Ross, o frontman de uma das bandas mais icônicas dos últimos anos mostra um novo lado com a calma e a sofisticação que um filme de David Fincher requer.

Garota Exemplar é um suspense que acaba trazendo à tona questões sobre os limites do amor e da loucura e até a nossa relação com a mídia e a construção e desconstrução da imagem de pessoas em rede nacional. Tudo isso com o ritmo de Fincher, lento o suficiente para permitir que você conheça bem os personagens, e rápido o bastante para te manter preso à poltrona durante as quase duas horas e meia de filme. A trilha acompanha bem esse ritmo, crescendo aos poucos na medida em que a história escalona, surpreendendo a quem assiste. Trent Reznor conseguiu captar bem a essência, a suavidade e o impacto da linguagem de um dos melhores diretores da atualidade.

Mas se o vocal do NiN ainda é meio novato no ramo, Christopher Nolan apostou em um crédito um pouco mais conhecido para seu novo filme, Interestelar, que estreou na última quinta-feira em todo o Brasil. Hans Zimmer pode já ter trabalhado com Nolan algumas outras vezes – nos três últimos filmes da franquia Batman, A Origem e O Grande Truque, por exemplo -, mas essa foi a melhor oportunidade para ir além em suas composições. Filmes que se passam no espaço parecem ter como uma de suas tradições as trilhas marcantes, especialmente Star Wars e 2001: Uma Odisseia no Espaço, e Zimmer sabe disso.

Quem também abraçou a oportunidade foi Matthew McConaughey, em um novo momento na carreira, agora como ator oscarizado. Ele vive Cooper, um ex-engenheiro que teve uma missão espacial frustrada e mora com os filhos e o sogro em uma fazenda. Seria uma história como outra qualquer não fosse a situação do planeta, já sem condições de sequer produzir alimentação para todos seus habitantes. Cooper acaba indo em uma nova missão de exploração de uma nova galáxia, tida como a última chance para a humanidade.

Por se passar no espaço, Interestelar tem de abrir mão do som em muitos momentos. Mas isso não quer dizer que o filme não aproveite todos os outros momentos para exibir sua edição e mixagem de som caprichadas, além de ter na trilha uma de suas grandes aliadas. Com um ritmo que oscila entre a tensão pelas dificuldades enfrentadas pela equipe na nave, o drama familiar e longas explicações no estilo “quer que desenhe?” sobre ciência e espaço, o longa conta com Zimmer para ajudar a dar o tom das escaladas de suspense e drama. Mesmo pegando emprestado de Strauss e sua Assim falava Zaratrusta, imortalizada no cinema por Stanley Kubrick em 2001, Zimmer consegue impactar com seus temas orquestrados em órgão, cordas e percussões.

Esse é, no fim, o objetivo da trilha: ajudar a transportar quem assiste para a emoção do que acontece na tela. Tim Maia, Trent Reznor e Hans Zimmer fazem isso de formas muito diferentes, mas não é preciso ser fã de soul, Nine Inch Nails ou música clássica para se deixar levar por outro dos muitos truques de mágica do cinema: unir muitas linguagens em uma só, seja recriando mitos do passado, levando a frieza de um casamento em pedaços para o suspense ou o clássico para um mundo futurista.

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